A economia brasileira vive um momento de entusiasmo, mas com sinais de alerta. De acordo com um relatório do Bradesco, o país recebeu cerca de R$ 43,6 bilhões em investimentos entre meados de setembro e as primeiras semanas de outubro de 2024, sugerindo um fôlego renovado na atração de capital.
No entanto, essa recuperação ocorre em meio a um cenário econômico delicado, marcado pela recente elevação da taxa Selic para 10,75% ao ano.
A economista Priscila Pacheco, do Bradesco, aponta que esses aportes têm se concentrado na modernização de plantas fabris e em projetos greenfields, que visam aumentar a capacidade produtiva do país. Apesar da trajetória de crescimento registrada no início do ano, a alta dos juros pode frear a continuidade desse avanço, trazendo desafios para empresas e investidores.
Desde o início de 2024, o Brasil vem experimentando uma retomada no volume de investimentos. A recuperação é visível tanto na criação de novos projetos quanto na ampliação da capacidade produtiva de indústrias existentes. Esse crescimento é medido pela formação bruta de capital fixo (FBCF), que representa o investimento realizado pelas empresas para expandir suas operações.
No segundo trimestre deste ano, o Produto Interno Bruto (PIB) avançou 1,4%, com destaque para a FBCF, que cresceu 2,1% em relação ao trimestre anterior, segundo o IBGE. Em comparação com o mesmo período do ano passado, a FBCF registrou um aumento expressivo de 5,7%. Esses números indicam que o setor produtivo está confiante e disposto a investir para atender à demanda crescente, mesmo em um contexto global ainda incerto.
Parte significativa dos aportes mencionados pelo Bradesco está sendo direcionada para projetos greenfields. Esses projetos são aqueles que começam do zero, como novas fábricas e unidades produtivas. Além de contribuir para a modernização da indústria nacional, eles representam um compromisso de longo prazo das empresas com o mercado brasileiro.
“O investimento em projetos greenfields é um termômetro do otimismo das empresas”, explica Priscila Pacheco. “Quando as companhias decidem iniciar novas operações, isso demonstra confiança na estabilidade econômica e na demanda futura.” Esse tipo de projeto é essencial para gerar empregos, estimular a inovação e aumentar a competitividade da indústria brasileira no cenário global.
Apesar do otimismo inicial, a decisão do Banco Central de retomar o ciclo de alta dos juros pode trazer obstáculos para a continuidade dos investimentos. Em setembro, a Selic foi elevada para 10,75% ao ano, um movimento que visa controlar a inflação, mas que também tem repercussões no custo do crédito. Juros mais altos tornam o financiamento de novos projetos mais caro, o que pode desestimular as empresas a realizarem investimentos de grande porte.
Priscila Pacheco alerta que o impacto da elevação da Selic pode ser sentido nos próximos meses. “Com o crédito mais restritivo, as empresas tendem a postergar investimentos, e o consumo das famílias também pode diminuir, o que desacelera a economia como um todo”, afirma a economista.
Além disso, setores mais dependentes de financiamentos, como construção civil e infraestrutura, podem ser os primeiros a sentir os efeitos negativos da alta dos juros. Com menos crédito disponível e um custo maior para emprestar, novos projetos podem ser adiados ou até cancelados.
A trajetória dos investimentos no Brasil tem sido marcada por altos e baixos nos últimos anos. Em 2020, com o início da pandemia, o número de anúncios de novos aportes caiu drasticamente, passando de mais de 100 para apenas 20, segundo dados do Bradesco. A incerteza econômica global e as restrições sanitárias interromperam projetos em andamento e reduziram a confiança dos investidores.
Nos anos seguintes, houve uma recuperação gradual, mas instável. Em 2023, a economia enfrentou novos desafios, como inflação persistente e incertezas políticas, o que freou novamente os aportes. Somente em 2024, com sinais mais claros de recuperação, os investimentos voltaram a ganhar força. No entanto, o recente aumento da Selic reacendeu preocupações sobre a sustentabilidade desse crescimento.
Diante do cenário de juros elevados, é fundamental que o governo adote políticas públicas que incentivem os investimentos privados e reduzam os custos operacionais para as empresas. Programas de estímulo ao crédito, parcerias público-privadas e incentivos fiscais podem ser ferramentas essenciais para mitigar os efeitos negativos da alta dos juros.
Além disso, a manutenção da confiança dos investidores é crucial para evitar uma nova retração. “O Brasil ainda é um mercado atraente, especialmente em setores como energia renovável e tecnologia, mas é preciso um ambiente econômico estável para que os investimentos se concretizem”, destaca Pacheco.
Com o cenário econômico ainda em evolução, as expectativas para o restante de 2024 permanecem incertas. A continuidade dos investimentos dependerá de uma combinação de fatores, como a evolução da inflação, as próximas decisões do Banco Central sobre a Selic e o desempenho da economia global.
Setores estratégicos, como energia renovável, infraestrutura e agronegócio, devem continuar atraindo investimentos, mas com mais cautela. O governo e o Banco Central precisarão equilibrar as medidas de controle da inflação com ações que garantam o crescimento econômico sustentável.