Racismo nas escolas: mais da metade dos professores já presenciou casos

O racismo no ambiente escolar é uma realidade que precisa ser discutida com seriedade. A pesquisa realizada pelo Observatório Fundação Itaú, em conjunto com o Equidade.Info, revelou que mais da metade dos professores (54%) já presenciou casos de racismo entre seus alunos. Esse dado é alarmante e indica que as salas de aula, que deveriam ser espaços de inclusão e respeito, ainda refletem as desigualdades e preconceitos presentes na sociedade.

Além de expor a gravidade do racismo nas escolas, o estudo também oferece um panorama das diferentes percepções entre professores, alunos e gestores, e aponta para a necessidade urgente de medidas estruturais que enfrentem o problema. A análise traz à tona dados valiosos que ajudam a entender como o racismo se manifesta no dia a dia escolar e quais são os desafios para seu enfrentamento.

A pesquisa revelou que a percepção de racismo varia entre os diferentes níveis de ensino. Entre os professores do ensino fundamental II (6º ao 9º ano), o índice de docentes que já presenciaram casos de racismo sobe para 67%, enquanto entre os professores do ensino fundamental I (1º ao 5º ano), o índice é de 48%. No ensino médio, o percentual cai um pouco mais, para 47%.

Esses números indicam que o racismo é mais visível nos anos finais do ensino fundamental, onde os alunos começam a desenvolver de forma mais clara suas interações sociais e identitárias, muitas vezes refletindo preconceitos que trazem de suas vivências. O aumento no número de casos relatados pode estar ligado à maior exposição dos estudantes a diferentes grupos e à complexidade das interações sociais nessa fase.

Outra revelação importante da pesquisa é a diferença na percepção de racismo entre professores brancos e negros. Entre os docentes negros, 56% afirmaram ter presenciado casos de racismo em sala de aula, enquanto entre os professores brancos o índice foi de 48%. Essa disparidade evidencia como a vivência pessoal pode influenciar a percepção de um problema estrutural como o racismo.

A pesquisa também ouviu estudantes para entender como eles se sentem em relação à aceitação de suas características raciais no ambiente escolar. Quando perguntados se se sentiam respeitados por suas características físicas, como cabelos crespos, penteados ou cor da pele, 13% dos alunos negros discordaram dessa afirmação, enquanto entre os alunos brancos, o percentual foi de 8%.

Esses dados revelam que, apesar de um número considerável de estudantes brancos também se sentir desrespeitado, os alunos negros são desproporcionalmente afetados por questões de racismo e discriminação. Essa realidade reflete as dificuldades que muitos jovens negros enfrentam no processo de aceitação de sua identidade racial, especialmente em um ambiente que muitas vezes não promove o acolhimento necessário.

Além disso, o estudo analisou o clima escolar, mostrando que a sensação de acolhimento dos alunos diminui conforme eles avançam nas etapas de ensino. Nos anos iniciais do fundamental (1º ao 5º ano), o índice de acolhimento chega a 86%, mas cai para 77% entre os alunos dos anos finais do fundamental (6º ao 9º ano) e para 72% no ensino médio. Essa queda pode ser atribuída a diversas mudanças que os estudantes enfrentam, como a transição para novas escolas, a convivência com professores especializados em diferentes disciplinas e as mudanças físicas e emocionais características da adolescência.

O estudo também revelou os desafios que os professores enfrentam ao lidar com o racismo nas escolas. Entre os docentes brancos, 21% afirmaram não saber o que fazer diante de situações de racismo em sala de aula, enquanto entre os professores negros esse índice foi de 9%. Esse dado é significativo, pois mostra que muitos educadores ainda se sentem despreparados para enfrentar uma questão tão delicada e complexa.

Em média, 75% dos professores relataram que suas escolas têm procedimentos para lidar com casos de racismo. No entanto, a existência de protocolos não é suficiente para resolver o problema, uma vez que a formação e capacitação dos docentes é fundamental para que eles possam identificar, intervir e atuar de maneira eficaz nesses casos. Esmeralda Macana, coordenadora do Observatório Fundação Itaú, ressaltou que a formação dos professores é essencial para que eles estejam preparados para enfrentar o racismo e promover um ambiente escolar mais inclusivo.

Esmeralda Macana destacou que o enfrentamento ao racismo não deve ser uma responsabilidade exclusiva dos professores. A luta contra o preconceito racial nas escolas exige uma abordagem estruturada, que envolva toda a rede de ensino, incluindo gestores, funcionários, alunos e suas famílias. Segundo Esmeralda, é preciso criar um ambiente que valorize a identidade e a cultura dos alunos, especialmente dos estudantes negros, para que eles se sintam acolhidos e respeitados.

A coordenadora também mencionou a importância de um currículo escolar que inclua a história afro-brasileira e as relações étnico-raciais, conforme prevê a Lei 10.639/03. Essa legislação, que completa 20 anos, exige que as escolas promovam o ensino da história e cultura africana e afro-brasileira, mas sua implementação ainda enfrenta desafios. O acesso a materiais pedagógicos adequados e a formação de professores são passos fundamentais para garantir que o currículo seja enriquecido com conteúdos que combatam o racismo e promovam a diversidade.

Promover um clima escolar positivo é um dos principais desafios para as escolas que buscam combater o racismo e outras formas de violência. O estudo mostrou que a percepção de acolhimento nas escolas é maior entre os alunos brancos (84%) do que entre os alunos negros (78%). Essa diferença, embora pareça pequena, indica a necessidade de ações direcionadas para promover a inclusão e o respeito às diferentes identidades raciais.

Esmeralda Macana ressaltou que o ambiente escolar pode ser enriquecido com o uso de arte e cultura, ferramentas que ajudam a valorizar as diversas identidades presentes nas escolas e a construir um ambiente mais acolhedor. Além disso, a promoção de atividades que incentivem o respeito às diferenças e a compreensão mútua entre os alunos é fundamental para a criação de uma cultura de paz e respeito no ambiente escolar.

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