A Amazônia, uma das maiores e mais importantes florestas do mundo, é constantemente afetada pelas queimadas. Esses incêndios, muitos deles de origem criminosa ou provocados para a expansão agropecuária, têm impactos devastadores não apenas para a biodiversidade local, mas também para o equilíbrio climático do planeta.
De junho a agosto de 2024, as queimadas na Amazônia resultaram em um aumento significativo de emissões de gases do efeito estufa, elevando os níveis em 60% em comparação com o mesmo período do ano anterior. Esse dado alarmante foi divulgado pelo Observatório do Clima, e coloca em destaque as consequências das práticas de desmatamento e queimadas para o meio ambiente global.
As emissões provenientes dessas queimadas atingiram 31,5 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO²) equivalente, um número que se aproxima das emissões anuais de países como a Noruega. No entanto, especialistas alertam que os dados podem ser ainda mais preocupantes, já que as queimadas continuaram em setembro, um dos meses historicamente mais críticos para a incidência de incêndios na Amazônia.
O dióxido de carbono (CO²) é um dos principais gases de efeito estufa, responsável por aprisionar o calor na atmosfera e contribuir para o aquecimento global. Quando grandes áreas de florestas como a Amazônia são incendiadas, enormes quantidades de CO² são liberadas na atmosfera, exacerbando as mudanças climáticas. Segundo o Observatório do Clima, dos 2,4 milhões de hectares destruídos pelos incêndios entre junho e agosto de 2024, 700 mil hectares correspondiam a áreas de floresta, que por si só emitiram 12,7 milhões de toneladas de CO² equivalente.
A cientista Ane Alencar, diretora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), destacou que os dados do estudo ainda não incluem as queimadas ocorridas em setembro, o que pode elevar ainda mais os números alarmantes. “O pior, infelizmente, está acontecendo agora, em setembro”, afirmou Ane, ressaltando que o período mais crítico das queimadas geralmente ocorre no final do ano, quando a seca atinge seu ápice na região.
Além das emissões diretas provenientes da queima das árvores e da vegetação, outro fator preocupante é o que os cientistas chamam de “emissão tardia”. Isso ocorre devido à decomposição da matéria orgânica que foi queimada, que continua liberando gases de efeito estufa, como CO², durante anos após o incêndio. A estimativa dos especialistas é que, na próxima década, a vegetação destruída pelos incêndios de 2024 emitirá entre 2 e 4 milhões de toneladas adicionais de CO² equivalente, agravando ainda mais a situação.
Os incêndios também tornam as florestas mais vulneráveis a novos incêndios. Conforme as árvores queimadas perdem suas folhas e troncos caem, o material orgânico no solo aumenta, funcionando como combustível para novos incêndios. Esse ciclo faz com que, após um primeiro incêndio, a floresta se torne cada vez mais inflamável. “Quando o segundo fogo vem, ele é mais intenso e vai emitir bem mais gases de efeito estufa”, explica Ane Alencar.
As queimadas na Amazônia fragilizam a capacidade de resiliência da floresta, tornando-a menos capaz de se regenerar. Marcos Freitas, coordenador do Instituto Virtual de Mudanças Globais (Ivig), alerta que a Amazônia possui uma densidade de biomassa muito maior do que outros ecossistemas, como o Cerrado, o que significa que as queimadas na região liberam muito mais CO². “Na Amazônia, a gente trabalha com 250 a 300 toneladas de carbono por hectare”, afirma Freitas, destacando que a destruição de grandes áreas pode ter um impacto dramático no equilíbrio climático global.
Além disso, a destruição contínua da floresta pode ter efeitos diretos no ciclo hidrológico da região. Freitas também levantou preocupações sobre a evapotranspiração da floresta – o processo pelo qual as árvores liberam vapor de água para a atmosfera. A redução da evapotranspiração devido ao desmatamento pode aumentar a ocorrência de secas, agravando ainda mais as condições ambientais da Amazônia.
Os gases do efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO²), o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O), são responsáveis por aprisionar o calor do sol na atmosfera terrestre, o que leva ao aumento das temperaturas globais. Embora o CO² seja o mais abundante, o metano e o óxido nitroso são muito mais eficientes em reter o calor. De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), uma tonelada de metano, por exemplo, é equivalente a mais de 20 toneladas de CO² em termos de retenção de calor ao longo de 100 anos. No caso do óxido nitroso, a equivalência pode chegar a quase 300 toneladas de CO².
Embora esses gases representem uma pequena fração da composição atmosférica, eles desempenham um papel crucial na regulação da temperatura terrestre. O aumento de suas concentrações devido às atividades humanas, como as queimadas e o desmatamento, está diretamente relacionado ao aquecimento global e às mudanças climáticas, que afetam o planeta de diversas maneiras, desde o aumento das temperaturas até a elevação do nível do mar.
Enquanto o Brasil se comprometeu a reduzir suas emissões de gases do efeito estufa em acordos internacionais, as queimadas na Amazônia representam um enorme desafio para essas metas. O país já implementa esforços para reduzir as emissões em setores como o da agricultura e da indústria, mas os incêndios florestais e o desmatamento seguem como grandes vilões no combate ao aquecimento global.
A diretora científica do Ipam, Ane Alencar, destaca que as emissões provocadas pelas queimadas nem sempre são contabilizadas nos inventários de emissões de gases de efeito estufa, já que muitos incêndios não estão diretamente relacionados à conversão de florestas em áreas agrícolas. “É preciso que isso comece a ser levado em consideração, porque a pressão sobre o ecossistema amazônico é muito grande”, afirma Ane, enfatizando a necessidade de mais rigor na fiscalização e monitoramento das queimadas.
A Amazônia desempenha um papel essencial na regulação do clima global. Além de ser uma das maiores áreas de floresta tropical do mundo, a Amazônia é um dos principais sumidouros de carbono do planeta, absorvendo grandes quantidades de CO² da atmosfera e ajudando a mitigar os efeitos das mudanças climáticas. Quando a floresta é destruída, essa capacidade de absorção é drasticamente reduzida, e o carbono que estava armazenado nas árvores é liberado de volta para a atmosfera, intensificando o aquecimento global.
A preservação da Amazônia é, portanto, crucial não apenas para o Brasil, mas para o equilíbrio climático global. Proteger a floresta de queimadas e desmatamento é uma das principais estratégias para manter o aquecimento global em níveis controláveis, de acordo com os compromissos assumidos no Acordo de Paris.