A icônica fabricante de potes de plástico Tupperware, conhecida mundialmente por sua inovação no armazenamento de alimentos, anunciou oficialmente sua falência após 78 anos de história. A empresa, que se tornou sinônimo de recipientes plásticos, enfrentou dificuldades crescentes nos últimos anos, resultando em uma queda significativa nas vendas e no valor de suas ações. Mesmo assim, a companhia busca reestruturar-se judicialmente, solicitando autorização para vender o negócio sem interromper totalmente suas operações.
A falência da Tupperware marca o fim de uma era para uma marca que transformou o mercado de utensílios de cozinha, mas que, nos últimos tempos, falhou em atrair o público mais jovem e em adaptar-se às novas tendências do consumidor.
Fundada em 1946 pelo químico Earl Tupper, a Tupperware revolucionou o conceito de armazenamento de alimentos ao patentear potes de polietileno com fechamento hermético. Esses recipientes à prova de ar e água tornaram-se populares nas décadas seguintes, à medida que as famílias buscavam soluções práticas e duráveis para manter os alimentos frescos. A Tupperware logo se tornou uma marca associada à qualidade e à confiabilidade.
A inovação do produto, contudo, não foi suficiente para garantir o sucesso imediato nas lojas de departamento. Os consumidores tinham dificuldade em entender como utilizar corretamente as tampas vedadas duplamente, o que levou a uma solução de marketing inovadora: as festas Tupperware.
A estratégia que alavancou o sucesso da Tupperware foi idealizada por Brownie Wise, uma mulher de negócios que propôs um modelo de vendas diretas através de festas em domicílio. Durante essas reuniões, vendedoras — predominantemente mulheres — demonstravam os produtos da Tupperware para outras mulheres em suas casas, criando uma atmosfera de comunidade e confiança. Essa abordagem não só aumentou as vendas, como também permitiu que muitas mulheres gerassem uma fonte de renda própria em uma época em que o mercado de trabalho era limitado para elas.
Wise foi contratada por Earl Tupper e ajudou a consolidar a marca como um ícone global, com as “festas Tupperware” se tornando um verdadeiro fenômeno de marketing. Contudo, desavenças entre Wise e Tupper sobre a direção estratégica da empresa resultaram na demissão de Wise em 1958. Apesar disso, o modelo de vendas diretas permaneceu como uma parte essencial do negócio por décadas.
Embora a Tupperware tenha desfrutado de um breve aumento nas vendas durante a pandemia de covid-19, quando mais pessoas cozinharam em casa, o crescimento não foi suficiente para reverter o declínio contínuo da marca. O aumento dos custos de matérias-primas, salários mais altos e as despesas de transporte impactaram diretamente as margens de lucro da empresa. Além disso, a concorrência crescente de marcas mais modernas e ecológicas contribuiu para o afastamento dos consumidores.
De acordo com Neil Saunders, diretor-gerente de varejo da consultoria GlobalData, a Tupperware “não acompanhou os tempos em termos de seus produtos e distribuição”. Ele explica que o modelo de vendas diretas através das festas não consegue mais atrair os clientes mais jovens, e que mesmo os consumidores mais antigos, que associavam a marca aos tempos áureos, mudaram seus hábitos de compra.
Nos últimos anos, a Tupperware tentou reposicionar sua marca, ampliando sua linha de produtos e explorando novas parcerias de varejo, como a colaboração com a rede de lojas Target nos Estados Unidos. A empresa também lançou novos itens, como uma churrasqueira que pode ser usada no micro-ondas, na tentativa de diversificar sua oferta e atrair um público mais jovem e moderno.
Apesar dessas tentativas, os resultados ficaram aquém das expectativas. Segundo Susannah Streeter, diretora de mercados da consultoria Hargreaves Lansdown, “a festa acabou há muito tempo para a Tupperware”. Ela afirma que as mudanças nos hábitos dos consumidores, que buscam soluções mais ecológicas e práticas, contribuíram para o declínio da marca. O afastamento dos plásticos e a crescente preferência por produtos sustentáveis, como recipientes de vidro ou silicone reutilizável, reduziram ainda mais a demanda pelos produtos da Tupperware.
Além disso, a pandemia de covid-19 impactou fortemente as operações da empresa, especialmente na China, onde as políticas de isolamento social dificultaram a distribuição e o acesso aos produtos. A força de trabalho de vendedores diretos da Tupperware também diminuiu significativamente, com uma queda de 18% em 2022 em comparação com o ano anterior.
Com uma dívida superior a 700 milhões de dólares, a Tupperware enfrentou dificuldades crescentes para administrar suas finanças. Negociações prolongadas com credores não conseguiram reverter a situação crítica, e as ações da empresa caíram mais de 50% após o anúncio da falência. A Tupperware havia alertado já em 2022 que, se não levantasse novos fundos, entraria em falência, e a situação financeira apenas se agravou desde então.
Streeter também observou que “sérios reveses” nos relatórios financeiros da empresa, incluindo divulgações incorretas em 2021 e 2022, contribuíram para a perda de confiança dos investidores. Esses problemas, somados à falta de inovação significativa no portfólio de produtos e à dificuldade em se adaptar às mudanças no mercado, precipitaram o colapso da marca.
Apesar de sua queda, a Tupperware deixa um legado significativo tanto no mercado de utensílios domésticos quanto na cultura popular. Seus produtos não apenas revolucionaram o armazenamento de alimentos, mas também empoderaram gerações de mulheres ao oferecer uma oportunidade de independência financeira por meio das vendas diretas. As festas Tupperware foram um marco na história do marketing e são lembradas como um exemplo bem-sucedido de vendas baseadas em relações interpessoais.
Hoje, o nome Tupperware ainda é amplamente utilizado como sinônimo de potes plásticos, o que reflete o impacto profundo da marca no imaginário coletivo. Mesmo diante de seu declínio, a empresa continua a ser um símbolo de inovação e empreendedorismo, representando uma era em que a simplicidade e a praticidade moldaram a forma como as pessoas armazenam alimentos.