Nascido em Dublin, em 1882, James Joyce foi um dos escritores mais importantes do século XX e um dos maiores expoentes do movimento modernista e da técnica do “fluxo de consciência”. Embora seja um dos grandes orgulhos da cidade que o viu nascer, tendo até escrito uma obra intitulada “Dublinenses”, Joyce viveu grande parte de sua vida fora da Irlanda.
Ele viajou para Paris para estudar medicina e, mais tarde, para cidades como Trieste e Zurique (onde morreu em 1941) para fugir à Primeira Guerra Mundial. Além de “Dublinenses”, suas obras mais importantes são “Ulisses”, considerada sua obra-prima, o autobiográfico “Retrato do Artista Quando Jovem” e “Finnegans Wake”, uma obra notoriamente complexa e difícil de traduzir.
Apesar de ser um autor controverso — Vladimir Nabokov, embora reconhecesse o brilhantismo de “Ulisses”, considerava “Finnegans Wake” absolutamente horrível, e Virginia Woolf foi uma de suas críticas ferozes —, Joyce influenciou a obra de autores como Samuel Beckett, Jorge Luis Borges, Salman Rushdie, John Updike e David Lodge.
Em Dublin, para além das inúmeras estátuas erguidas em sua honra, comemora-se anualmente o Bloomsday – dia dedicado à vida e obra de Joyce, celebrado no dia 16 de junho, data em que se desenrola a narrativa de “Ulisses”.
1. Um jovem prodígio
Apesar de ter publicado seu primeiro livro em 1907, com 25 anos de idade, James Joyce escreveu seu primeiro poema com apenas nove anos. “Et Tu Healy?” foi publicado por seu pai e distribuído entre familiares e amigos. Embora não tenham sobrevivido cópias integrais do poema, alega-se que o pai do jovem Joyce estava tão orgulhoso do feito do filho que enviou cópias do poema até para o próprio Papa.
2. Medo irracional de tempestades
Desde criança, Joyce demonstrava um medo irracional de tempestades. Quando questionado por um amigo sobre a razão desse medo, Joyce respondeu que seu amigo claramente não tinha sido educado como um irlandês católico, como ele. Joyce acreditava que tempestades eram manifestações da raiva de Deus contra ele, e manteve esse receio até a vida adulta.
Em “Finnegans Wake”, ele criou uma palavra com 100 letras para representar simbolicamente o raio fulminante de Deus: “Bababadalgharaghtakamminarronnkonnbronntonnerronntuonnthunntrovarrhounawnskawntoohoohoordenenthurnuk”. A palavra é composta por várias representações da palavra “trovão” em diferentes idiomas.
3. Cartas eróticas leiloadas
Em 1931, depois de 27 anos de namoro, Joyce casou com Nora Barnacle, uma mulher de Galway com quem já tinha dois filhos. Até o final de seus dias, Nora foi sua musa, inspirando a personagem Molly Bloom em “Ulisses”. Além disso, a relação do casal ficou conhecida pelas cartas eróticas que trocavam. Uma dessas cartas, explicitamente sexual, foi leiloada em 2004 por £240,800 – o preço mais elevado pago por uma carta autografada do século XX.
4. Publicação de “Ulisses” pela fundadora da Shakespeare and Company
Até ser publicado integralmente em 1922, “Ulisses” começou a ser publicado em série na revista americana “Little Review”, com a ajuda do poeta Ezra Pound. Contudo, após um dos capítulos ser julgado obsceno, os editores da revista enfrentaram um processo judicial. Joyce teve dificuldades em encontrar alguém disposto a publicar a obra, que foi banida nos EUA e recusada por editores célebres como Virginia Woolf.
Em Paris, Joyce encontrou apoio em Sylvia Beach, fundadora da livraria Shakespeare and Company, que publicou a primeira edição de “Ulisses”. Embora fosse uma editora inexperiente, Sylvia reconheceu o potencial da obra de Joyce e publicou 1000 cópias iniciais. O livro continuou banido em vários países por anos, só sendo autorizado nos EUA em 1933.
5. O primeiro cinema da Irlanda
Em 1909, enquanto vivia em Trieste, Joyce foi informado por sua irmã Eva que a Irlanda não tinha ainda uma sala de cinema. Aproveitando a oportunidade, Joyce se juntou a quatro investidores italianos e ajudou a abrir o cinema Volta, na Mary Street, em Dublin. Embora não fosse apaixonado pela sétima arte, o investimento foi uma forma de financiar a publicação de suas obras. O cinema Volta, no entanto, manteve-se aberto por apenas sete meses sob a administração de Joyce, mas continuou a funcionar até 1948.
6. Amizade com Ernest Hemingway
Foi na livraria de Sylvia Beach, em Paris, que Joyce conheceu Ernest Hemingway, um dos seus amigos mais próximos no meio literário. Hemingway, autor de obras como “Por Quem os Sinos Dobram” e “O Velho e o Mar”, era frequentador assíduo dos cafés e bares de Paris.
Na companhia de Hemingway, Joyce, que era magro, franzino e tinha problemas de visão, abusava do álcool e iniciava confrontos físicos, deixando Hemingway para lidar com as consequências. Hemingway recordou que Joyce dizia: “Lida com ele, Hemingway! Lida com ele!”.
7. Encontro desastroso com Marcel Proust
Em 1922, Joyce conheceu Marcel Proust, autor de “Em Busca do Tempo Perdido”, em uma festa organizada pelo compositor Igor Stravinsky, em Paris. Apesar de ambos serem dotados de mentes brilhantes, a conversa entre eles não fluía, e eles acabaram discutindo sobre trufas. Joyce chegou à festa bêbado e mal vestido, enquanto Proust estava atrasado e indisposto, o que contribuiu para um encontro tenso e pouco produtivo.
8. Últimas palavras enigmáticas
Após ser admitido no hospital em Zurique para uma cirurgia, que o levou ao coma e posteriormente à morte, as últimas palavras de Joyce foram “Será que ninguém compreende?” (“Does nobody understand?”). Ele morreu no dia 13 de janeiro de 1941 e foi enterrado no cemitério Fluntern, em Zurique. Em 16 de junho, a Irlanda celebra o Bloomsday, em homenagem a Leopold Bloom, o protagonista de “Ulisses”. É o único dia no mundo dedicado a uma personagem literária.
James Joyce foi uma figura controversa e revolucionária, cuja genialidade literária deixou um legado indelével na literatura moderna. Suas obras, que exploram a mente humana e a vida cotidiana com uma profundidade sem precedentes, continuam a inspirar e desafiar leitores e escritores em todo o mundo.
A celebração anual do Bloomsday é um testemunho da influência duradoura de Joyce, perpetuando seu impacto na cultura literária e destacando a importância de sua contribuição para o modernismo e a literatura ocidental.
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