Audiência Pública debate projeto que trata das casas de apoio para portadores de transtornos mentais

Quase um bilhão de pessoas – incluindo 14% dos adolescentes do mundo – viviam com um transtorno mental, em 2019, segundo dados divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A questão da saúde mental foi abordada durante uma audiência pública realizada na Assembleia Legislativa do Paraná, na tarde desta quarta-feira (19), que discutiu o projeto de lei 900/2023, que pretende instituir a Política Estadual das Casas de Apoio para Portadores de Transtornos Mentais no Estado do Paraná.

De acordo com o deputado Delegado Tito Barichello (União), autor da proposta – elaborada em coautoria com o deputado Luiz Claudio Romanelli (PSD), por muito tempo o tratamento foi baseado, especificamente, no isolamento das pessoas com algum tipo de transtorno mental: “Isso acabou gerando um grande contingente de pacientes afastados por longo tempo do convívio social e que precisam de especial apoio para sua reinserção na sociedade.

O que, por sua vez, provoca uma discussão na sociedade em relação a forma que os poderes públicos podem auxiliar hoje para a ressocialização e com o tratamento”, analisou. Barichello, proponente da audiência pública e líder do Bloco Parlamentar da Segurança Pública, informou que existem somente cerca de 60 casas de acolhimento regulamentadas no Paraná, o que não é suficiente para o atendimento dos pacientes que precisam de assistência, de apoio profissional. “Precisamos fomentar esse serviço de acolhimento. É uma luz para essas pessoas”, sublinhou. O deputado assegurou que vai lutar para a aprovação da proposta.

“Temos muitas dificuldades porque não existe hoje uma regulamentação”, disse Rafael Evandro da Silva, representante das casas de apoio, que falou sobre a origem e características dessas instituições, bem como, as legislações vigentes, enfatizando a importância do projeto.

Ele explicou que muitos desses espaços de acolhimento são instituições privadas com fins lucrativos, servem de moradia para inúmeras pessoas vulneráveis, e trabalham com contratos estabelecidos com municípios. “Temos a preocupação de reinserir essas pessoas na família, na sociedade, através de inúmeras ações, inclusive cursos”, complementou. “O projeto em debate cria parâmetros para a oferta do serviço, padronizando os atendimentos, permitindo um atendimento com dignidade, como essas pessoas merecem”, opinou.

Segundo ele, as residências terapêuticas mantidas pelo poder público no estado não têm hoje capacidade para atender a demanda atual.

Espaços de acolhimento e tratamento

Durante a audiência pública, que lotou o espaço do Plenarinho, diferentes setores da sociedade expressaram suas opiniões e experiências, incluindo profissionais de saúde mental, familiares de pacientes, legisladores, e membros da comunidade.

A professora e delegada Tathiana Guzella, assessora parlamentar do deputado federal Felipe Francischini, apresentou um breve relato sobre o assunto com foco na sua experiência na segurança pública: “Qual é a primeira e única porta aberta para a população quando acontece uma situação de delito penal? É a da delegacia de polícia, que atende o povo, e conhece a miséria do povo.

Por isso, posso dizer que temos muitas pessoas com transtornos mentais. Centenas de pessoas que prendemos ou ouvimos como testemunhas estavam vivenciando um momento de crise, apresentavam algum tipo de transtorno mental”. “Elas precisavam de tratamento, de cuidados”, declarou. Para Rúbia Oliveira, gerente de proteção social especial da Fundação de Ação Social de Curitiba (FAS), o trabalho das casas de apoio é de excelência: “Elas têm a função de proteger essas pessoas que não dão conta de viver sozinhas, de tomar um remédio”, observou. “Muitas vezes, elas deixam de tomar o remédio, podendo se tornarem agressivas, e não têm noção das suas ações”, explicou.

Ela entende que o projeto 900/2023 tem a função de estabelecer um “regramento para as casas de apoio”.

Já os advogados Rafael Bucco Rossot e Edgar Ferreira Ferraz Neto, da Associação das Casas de Apoio, apresentaram informações e orientações técnicas sobre os casos de demandas de decisões judiciais que chegam aos municípios, e posteriormente, as casas de apoio, solicitando o atendimento de pacientes com problemas de saúde mental.

Ambos também garantiram que a proposição que tramita na Assembleia tem um papel fundamental para organizar e assegurar qualidade a esse serviço. “Vamos lutar para que seja aprovado”, disse Rossot. Por outro lado, Ana Paula dos Santos Marcos, tesoureira da Associação das Casas de Apoio, fez uma apresentação geral – e emocionada – sobre os acolhidos e deu um rápido depoimento em relação ao dia a dia do trabalho feito pelos espaços de acolhimento: “Não é um local onde as pessoas apenas comem e dormem. Elas recebem todo um suporte multiprofissional para ter o seu direito garantido. Muitas vezes os pacientes chegam até sem documentos”, exemplificou.

Na sequência foi exibido um vídeo com imagens e testemunhos de profissionais e familiares de pacientes enaltecendo a importância da atuação das casas de apoio.

O que diz a proposta em debate

“A vida moderna exige cada vez mais cuidados com a saúde mental. Dados da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) sugerem que um terço da população das Américas teve ou terá algum transtorno”, afirmou Romanelli, coautor da proposição, ao falar sobre a importância da regulamentação das casas de apoio e do debate realizado hoje.

Ele destacou que no Brasil, situações como depressão e ansiedade, já estão entre as dez maiores causas de incapacidade. “É importante fortalecer políticas públicas que facilitem a identificação deste grave problema de saúde pública, e que se ofereça atendimento adequado aos pacientes.

Neste sentido, o PL 900/2023 é um instrumento que ajuda a valorizar as casas de apoio que oferecem suporte de qualidade a quem precisa tratar de transtornos mentais”, frisou.

O projeto de lei, protocolado no ano passado, já está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que tem a responsabilidade de avaliar a legalidade e constitucionalidade das proposições.

O relator da matéria na Comissão, deputado Hussein Bakri (PSD), líder do Governo, solicitou que o PL fosse “baixado em diligência para a Secretaria de Estado da Saúde”. Isto significa que foi solicitada a avaliação do órgão do Poder Executivo, antes da apresentação do parecer do relator.

A proposta estabelece que “entende-se como Casa de Apoio para Portadores de Transtornos Mentais, as moradias ou casas destinadas exclusivamente a cuidar de Portadores de Transtornos Mentais e com idade entre 18 e 59 anos”. E, que não poderão exceder o número máximo de 34 moradores por unidade.

Para conferir a íntegra do projeto, e os detalhes da tramitação, é só clicar no link “Pesquisa Legislativa”, no site da Assembleia: https://consultas.assembleia.pr.leg.br/#/proposicao

Não recebem tratamento

A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) informa que “existem diversos transtornos mentais, com apresentações diferentes. Eles geralmente são caracterizados por uma combinação de pensamentos, percepções, emoções e comportamento anormais, que também podem afetar as relações com outras pessoas”.

Cita, que entre os transtornos mentais, estão a depressão, o transtorno afetivo bipolar, a esquizofrenia e outras psicoses, demência, deficiência intelectual e transtornos de desenvolvimento, incluindo o autismo. Conforme a OPAS, os sistemas de saúde ainda não responderam adequadamente à carga dos transtornos mentais.

E alerta: como consequência, a distância entre a necessidade de tratamento e sua oferta é ampla em todo o mundo. “Em países de baixa e média renda, entre 76% e 85% das pessoas com transtornos mentais não recebem tratamento. Em países de alta renda, entre 35% e 50% das pessoas com transtornos mentais estão na mesma situação”, informa.

Participaram também do debate realizado na Assembleia Legislativa a deputada Flávia Francischini (União); o delegado Renato Bastos Figueroa, chefe do Núcleo Estadual de políticas sobre Drogas (NEPSD), representando o Secretário te Estado de Segurança Pública, Coronel Leôncio Teixeira; o vereador Rodrigo Reis, representando a Câmara Municipal de Curitiba; especialistas, familiares de pacientes e estudantes. Transmitida ao vivo pela TV Assembleia e redes sociais oficiais, o vídeo sobre a audiência pública já está disponibilizado no canal do YouTube da Assembleia. 

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