No século 18, um navio mercante chamado Providentz naufragou nas frias águas do Mar do Norte, na costa da Noruega. Desde então, a verdadeira causa desse trágico evento permaneceu um mistério, envolto em disputas e acusações entre o piloto e a tripulação. Recentemente, novas investigações dos escombros do navio trouxeram à tona revelações surpreendentes, sugerindo que tanto a incompetência quanto a embriaguez podem ter contribuído para o naufrágio.
O contexto histórico do Providentz
O Providentz era um navio mercante de propriedade de Joseph e Walter Lavit, membros de uma influente família da cidade de Cork, na Irlanda. Conhecidos por sua proeminência na comunidade local, ambos serviram como prefeitos e foram homenageados com áreas públicas nomeadas em suas memórias. O navio zarpou do porto de Cork com destino a Arendal, na Noruega, em 22 de setembro de 1721, carregando uma valiosa carga de manteiga, milho, grãos e malte.
Após um mês de viagem, o Providentz chegou à cidade de Mandal, na Noruega, onde aguardou melhores condições climáticas para prosseguir. No dia 9 de novembro, um piloto local foi trazido a bordo para auxiliar na navegação segura do navio de volta ao mar, mas algo deu terrivelmente errado. O Providentz encalhou, um buraco abriu-se em seu casco e o navio afundou rapidamente, embora felizmente toda a tripulação tenha escapado ilesa.
A batalha judicial
Logo após o naufrágio, um julgamento foi convocado para determinar a causa do acidente. A ausência do piloto norueguês no tribunal, que enviou apenas uma carta em sua defesa, apenas aumentou o mistério. Na carta, ele acusava vários membros da tripulação, incluindo o imediato, de estarem bêbados no momento do acidente, sugerindo que a embriaguez comprometeu a capacidade da tripulação de operar o navio adequadamente.
Por outro lado, os tripulantes defenderam que a culpa recaía sobre o piloto. Segundo eles, o capitão cometeu um erro crucial durante as manobras, confundindo estibordo (lado direito) com bombordo (lado esquerdo), o que teria sido a causa principal do naufrágio. A disputa se arrastou, com ambos os lados tentando se eximir da responsabilidade, deixando a verdade enterrada sob as águas do Mar do Norte.
Novas descobertas subaquáticas
Em 2020, os restos do Providentz foram descobertos pelo clube de mergulho de Mandal. Desde então, o Museu Marítimo Norueguês tem liderado esforços para recuperar e analisar os destroços do navio. Essas investigações trouxeram à tona evidências cruciais que permitiram aos pesquisadores avançar na compreensão dos eventos que levaram ao naufrágio.
Em abril deste ano, uma equipe de reconhecimento, liderada pelo arqueólogo marinho Jørgen Johannessen, confirmou a identidade do Providentz. Utilizando amostras de madeira e tubos de argila encontrados no local, marcados com o selo “Cork”, bem como o estilo de construção do navio, os arqueólogos conseguiram estabelecer uma conexão definitiva com o navio que afundou há mais de 300 anos.
LEIA MAIS: Descoberta uma ponte submersa em caverna construída há 6 mil anos
A análise dos escombros e o veredito dos especialistas
Com as novas descobertas, os especialistas puderam formular hipóteses mais robustas sobre o que ocorreu na noite do naufrágio. Segundo Johannessen, embora o relato do piloto sobre a embriaguez da tripulação possa ter um fundo de verdade, o erro de navegação parece ser o fator mais determinante no acidente.
Johannessen destaca que, na época, era comum que pilotos e tripulantes consumissem bebidas alcoólicas, mas tal prática raramente interferia na habilidade de navegação de marinheiros experientes. Ele argumenta que a confusão do capitão entre estibordo e bombordo, conforme relatado pelos tripulantes, foi provavelmente o que selou o destino do Providentz. “Embora alguns membros da tripulação pudessem estar bêbados, como o piloto alegou, é provável que o seu erro de navegação tenha ofuscado essa questão. Muito possivelmente, esse tenha sido o principal fator responsável pelo naufrágio do navio”, afirmou Johannessen.
O impacto cultural e histórico do naufrágio
O naufrágio do Providentz não é apenas um evento isolado na história marítima; ele também reflete os desafios e perigos enfrentados pelos marinheiros do século 18. A batalha judicial que se seguiu ao acidente destaca as tensões e responsabilidades que pesavam sobre aqueles que navegavam os mares naquela época, especialmente em regiões notoriamente traiçoeiras como o Mar do Norte.
Além disso, a história do Providentz oferece uma janela para entender melhor as práticas de navegação e o comércio marítimo do período. Os restos do navio e sua carga proporcionam informações valiosas sobre os materiais transportados entre Irlanda e Noruega, bem como as técnicas de construção naval da época. Essas descobertas têm o potencial de enriquecer nosso conhecimento sobre a interconexão entre as nações europeias e o desenvolvimento do comércio transatlântico.
Conclusão
Após mais de 300 anos, o mistério do naufrágio do Providentz começa a ser desvendado, graças aos esforços contínuos dos arqueólogos e pesquisadores. Embora as acusações mútuas de incompetência e embriaguez tenham complicado a busca pela verdade, as evidências agora apontam para um erro humano como a principal causa do acidente.
O trabalho de arqueólogos como Jørgen Johannessen não apenas esclarece eventos passados, mas também preserva a rica história marítima da Noruega e da Europa. Enquanto novas investigações continuam a emergir, o Providentz serve como um lembrete de que, mesmo nos momentos de maior desespero, há lições a serem aprendidas e histórias a serem contadas.