Uma descoberta impressionante na Bacia de Carste Mirador-Calakmul, na Guatemala, trouxe à tona um complexo maia perdido, coberto por milênios de vegetação densa. Geólogos, com o auxílio da tecnologia LiDAR (Light Detection and Ranging), revelaram uma rede extensa de mais de 1.000 assentamentos, conectados por cerca de 160 quilômetros de calçadas, em uma área de 1.700 km².
Este sítio arqueológico remonta a até 1.000 anos, datado entre os períodos Pré-Clássico Médio e Final, que vão de 1.000 a.C. a 250 a.C. A descoberta foi possível graças aos lasers da tecnologia LiDAR, que permitem mapear o relevo por baixo da cobertura florestal, destacando construções invisíveis a olho nu.
A revolução da arqueologia com o uso do LiDAR
A pesquisa foi publicada na revista científica Ancient Mesoamerica, e representa um avanço significativo na arqueologia moderna, mostrando como a tecnologia LiDAR está transformando a forma como compreendemos as antigas civilizações.
O LiDAR, que consiste no envio de pulsos de laser para a superfície terrestre, mede o tempo que o laser leva para retornar, criando um mapa tridimensional do terreno. Esse método foi crucial para desvendar a magnitude do complexo maia, que permaneceu oculto pela densa vegetação da região.
A Bacia de Carste Mirador-Calakmul é um ponto central para a civilização maia, abrigando diversos assentamentos que, segundo os cientistas, estavam interligados política e economicamente de maneira inédita no Hemisfério Ocidental.
As calçadas, que atravessam longas distâncias, eram usadas pelos antigos maias como rotas de transporte, conectando vilas, centros religiosos e áreas de produção agrícola. A pesquisa também encontrou grandes plataformas, pirâmides e uma complexa rede de canais e reservatórios de água, que funcionavam como cisternas para o armazenamento de recursos hídricos.
A importância geológica e agrícola da região de Mirador-Calakmul
Os cientistas acreditam que a localização da Bacia de Mirador-Calakmul foi estratégica para os maias devido à sua diversidade geográfica. A região, descrita como a “cachinhos de ouro” pelos especialistas, oferecia uma mistura perfeita de terras altas e baixas, possibilitando a construção de assentamentos e o cultivo agrícola em larga escala. Nas áreas elevadas, onde o solo é mais seco, os maias encontraram calcário abundante, um dos principais materiais de construção de suas impressionantes pirâmides e edifícios.
Já nas áreas baixas, os pântanos sazonais conhecidos como bajos proporcionavam terras férteis para o cultivo agrícola. O solo desses locais é rico em matéria orgânica, o que possibilitava a prática de agricultura em terraços, uma técnica sofisticada usada pelos maias para maximizar a produção de alimentos. Essa combinação de terras altas para assentamento e terras baixas para cultivo fez da Bacia de Carste Mirador-Calakmul um centro de desenvolvimento econômico e político para os maias.
Uma civilização conectada por estradas e tecnologia hidráulica
Uma das grandes revelações da pesquisa foi a extensão das calçadas que interligavam os assentamentos. Essas passarelas, que cobrem mais de 160 quilômetros, formavam uma rede de transporte vital, permitindo a movimentação de pessoas e mercadorias por toda a região. A estrutura dessas estradas indica uma sociedade altamente organizada, com controle centralizado sobre a logística e o comércio.
Além das estradas, o estudo encontrou vestígios de uma elaborada infraestrutura hidráulica, com canais e reservatórios de água que abasteciam os assentamentos. Esses reservatórios funcionavam como cisternas, garantindo o acesso à água durante os períodos de seca. Para uma civilização que floresceu em uma região com desafios climáticos significativos, a capacidade de gerenciar os recursos hídricos era crucial para a sobrevivência e o crescimento da população maia.
Descobertas arqueológicas em outras regiões com o uso do LiDAR
Embora o uso do LiDAR na Guatemala tenha revelado novos detalhes sobre a civilização maia, essa tecnologia também tem sido utilizada em outras partes do mundo para descobertas arqueológicas igualmente impressionantes. Em 2015, o LiDAR foi usado para explorar partes inexploradas da Amazônia brasileira, revelando sinais de cidades antigas que estiveram escondidas por séculos sob a densa vegetação da floresta.
Além disso, o LiDAR já foi aplicado com sucesso em países como Equador, Tonga e México, onde redes de antigas civilizações foram descobertas com essa tecnologia. A aplicação do LiDAR permitiu que arqueólogos encontrassem cidades inteiras perdidas nas selvas, ruínas e complexos que antes eram desconhecidos. Essas descobertas, assim como na Guatemala, estão mudando nossa compreensão das civilizações antigas e da forma como elas organizavam suas sociedades.
Implicações da descoberta para o estudo da civilização maia
A descoberta na Bacia de Carste Mirador-Calakmul tem implicações profundas para o estudo da civilização maia e do desenvolvimento das sociedades pré-colombianas nas Américas. Ao revelar um sistema integrado de assentamentos interconectados por estradas e redes hídricas, a pesquisa oferece novas evidências sobre como os maias organizaram suas cidades, suas práticas agrícolas e suas infraestruturas políticas e econômicas.
Essa descoberta também desafia suposições anteriores sobre o isolamento das diferentes cidades maias. Ao invés de pequenas comunidades independentes, as evidências sugerem que a Bacia de Carste Mirador-Calakmul foi um centro politicamente unificado, onde os assentamentos colaboravam entre si, compartilhando recursos e tecnologias. Essa nova visão da civilização maia pode levar a uma reinterpretação da história dessa cultura e de sua influência no desenvolvimento de outras sociedades na Mesoamérica.
A preservação e o futuro da pesquisa arqueológica na Guatemala
Apesar das novas descobertas, a preservação dos sítios arqueológicos da civilização maia continua sendo um desafio. A Guatemala, com sua rica herança cultural, enfrenta dificuldades para proteger esses locais da exploração ilegal, do desmatamento e da degradação ambiental. Iniciativas de conservação são essenciais para garantir que os achados permaneçam intactos para as gerações futuras.
A colaboração entre geólogos, arqueólogos e governos locais será crucial para expandir o uso da tecnologia LiDAR em futuras pesquisas. A cada nova descoberta, a imagem da civilização maia se torna mais complexa e fascinante, revelando uma sociedade avançada que deixou um legado duradouro no desenvolvimento das civilizações nas Américas.