A Lei nº 11.340/2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, completou 18 anos de sua promulgação, marcando um período significativo na luta contra a violência doméstica no Brasil. Nomeada em homenagem à biofarmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, que sobreviveu a duas tentativas de homicídio por parte de seu marido em 1983 e transformou sua tragédia pessoal em uma missão de vida para combater a violência contra as mulheres, a lei é um marco jurídico e social.
Sua criação e implementação trouxeram medidas protetivas fundamentais para romper o ciclo de violência doméstica e garantir a segurança e dignidade das mulheres brasileiras.
Antes da Lei Maria da Penha, a violência doméstica era tratada de forma leniente, muitas vezes considerada um crime de menor potencial ofensivo. Esse cenário permitia que agressores ficassem impunes ou recebessem penas leves, como multas ou cestas básicas, perpetuando um ciclo de violência e impunidade. Marisa Sanematsu, diretora de Conteúdo do Instituto Patrícia Galvão, relembra que “as agressões contra mulheres eram tratadas como uma questão menor, um assunto privado, a ser resolvido entre quatro paredes.”
A criação da lei foi uma resposta a essa realidade cruel. A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, destaca que a lei trouxe ganhos significativos para a sociedade brasileira, tipificando diversas formas de violência – física, psicológica, patrimonial, moral e sexual – e organizando o Estado para atender e proteger as mulheres.
Uma das principais inovações da Lei Maria da Penha são as medidas protetivas de urgência, que permitem afastar o agressor do lar ou local de convivência, proibir o contato com a vítima, suspender o porte de armas e monitorar os acusados por meio de tornozeleiras eletrônicas. Além disso, a lei prevê a criação de delegacias especializadas de atendimento à mulher, casas-abrigo, centros de referência multidisciplinares e juizados especiais de violência doméstica.
Lisandra Arantes, advogada e conselheira do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFemea), considera a Lei Maria da Penha um dos principais avanços na legislação brasileira em termos de proteção às mulheres. “A lei reconhece a violência motivada pela misoginia e pelas questões de gênero, e isso foi um passo crucial para a proteção das mulheres.”
Apesar dos avanços legais, a violência contra a mulher ainda é uma realidade alarmante no Brasil. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revelam que, em 2022, mais de 640 mil processos de violência doméstica e feminicídio ingressaram nos tribunais brasileiros. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023 mostra que todos os registros de crimes com vítimas mulheres aumentaram em comparação ao ano anterior, incluindo homicídio, feminicídio, agressões, ameaças, perseguição, violência psicológica e estupro.
No ano passado, 258.941 mulheres foram agredidas, um aumento de 9,8% em relação a 2022. Os casos de ameaça subiram 16,5%, totalizando 778.921 registros, enquanto os de violência psicológica aumentaram 33,8%, chegando a 38.507.
Outro dado preocupante é o crescimento dos feminicídios. Entre 2015 e 2023, pelo menos 10.655 mulheres foram vítimas desse crime no Brasil. Em 2023, o número de feminicídios cresceu 1,4% em relação ao ano anterior, atingindo 1.463 vítimas, o maior número registrado desde a criação da Lei nº 13.104/2015, que qualificou o feminicídio como crime hediondo.
Marisa Sanematsu sugere ações mais contundentes para enfrentar essa realidade. “Os números alarmantes de agressões e feminicídios comprovam a urgência de um pacto de tolerância zero contra a violência doméstica.”
Como parte das celebrações dos 18 anos da Lei Maria da Penha, o governo federal estabeleceu o Agosto Lilás, um mês dedicado à conscientização e combate à violência contra a mulher no Brasil. Essa iniciativa busca mobilizar a sociedade, promover debates e reforçar a importância da denúncia e do apoio às vítimas.