Uma descoberta arqueológica recente trouxe à tona um aspecto fascinante da vida dos antigos romanos: o uso da planta narcótica meimendro negro (Hyoscyamus niger). Este estudo, publicado na revista Antiquity, oferece novas evidências sobre como os romanos poderiam ter utilizado essa planta, conhecida tanto por suas propriedades medicinais quanto por seus efeitos alucinógenos. Mas o que motivava essa civilização a usar o meimendro negro?
Seria para aliviar dores, proporcionar prazer ou ambos? Neste artigo, exploramos essa descoberta e o que ela revela sobre a complexa relação entre humanos e plantas.
O meimendro negro é uma planta nativa da Europa e da Ásia, intimamente relacionada a outras plantas tóxicas, como o tabaco e a beladona. Por séculos, suas propriedades narcóticas e alucinógenas têm sido conhecidas e estudadas. A planta contém compostos químicos que podem provocar efeitos diversos, desde o alívio da dor até a indução de estados alterados de consciência.
Arqueólogos há muito encontram vestígios de meimendro negro em sítios romanos, mas a interpretação desses achados sempre foi um desafio. O fato de a planta crescer naturalmente na região torna difícil determinar se sua presença em locais arqueológicos é resultado de uso humano intencional ou apenas dispersão natural. Recentemente, no entanto, uma descoberta significativa trouxe novas luzes sobre essa questão.
Durante escavações em Houten-Castellum, arqueólogos descobriram um conjunto de sementes de meimendro negro dentro de um osso oco, que era um fêmur de ovelha ou cabra selado com alcatrão de casca de bétula. Esta descoberta, juntamente com uma flor de meimendro negro encontrada nas proximidades, sugere fortemente que a planta era utilizada intencionalmente pelos habitantes locais.
A Dra. Maaike Groot, da Freie Universität Berlin, principal autora do estudo, explicou que a presença da planta em contextos arqueológicos muitas vezes é atribuída a processos naturais. No entanto, o osso selado com alcatrão e repleto de sementes de meimendro negro é uma evidência clara de uso humano deliberado. “Argumentamos que futuras descobertas de meimendro negro devem ser estudadas levando em conta o contexto da descoberta e sua relação com outras plantas medicinais”, afirmou Groot.
A descoberta do meimendro negro junto a outras plantas medicinais em locais como o hospital da fortaleza romana em Neuss, na Alemanha, reforça a hipótese de que seu uso era principalmente terapêutico. Plantas como feno-grego, verbena, centáurea, erva-de-são-joão, endro e coentro foram encontradas ao lado das sementes de meimendro negro, sugerindo um uso sistemático de seus efeitos curativos.
Ademais, a presença de um esqueleto parcial de vaca e fragmentos de uma pedra de moer perto do osso selado levou os especialistas a acreditar que esses itens faziam parte de um ritual de abandono. Esse ritual envolvia deixar para trás objetos intencionalmente durante o abandono de um local ou estrutura, indicando um propósito ritualístico para o depósito das sementes.
Enquanto alguns estudiosos acreditam que os romanos usavam o meimendro negro para alívio da dor, outros sugerem que a planta era usada por seus efeitos recreativos e alucinógenos. Uma terceira hipótese combina as duas anteriores, sugerindo que a planta servia tanto para fins terapêuticos quanto para proporcionar prazer.
Autores clássicos como Plínio, o Velho, mencionaram as propriedades medicinais do meimendro negro, sugerindo que seu uso era mais terapêutico do que recreativo. No entanto, sem evidências concretas de como a planta era administrada e em que contextos específicos, essas hipóteses permanecem em aberto.
A descoberta em Houten-Castellum é um marco importante na arqueologia, oferecendo novas perspectivas sobre as práticas dos antigos romanos. Ela evidencia a complexa relação entre os seres humanos e as plantas, ilustrando como as sociedades antigas exploravam os recursos naturais para diversos fins. Além disso, o estudo da planta e seu contexto arqueológico pode fornecer insights valiosos sobre as práticas médicas e rituais de culturas passadas.
A recente descoberta de sementes de meimendro negro em um contexto ritualístico e medicinal entre os romanos antigos é uma janela fascinante para o passado. Ela não apenas nos oferece um vislumbre das práticas culturais e médicas dos romanos, mas também levanta questões intrigantes sobre como as plantas eram usadas para atender às necessidades humanas.
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