Quatro meses após as bombas Little Boy e Fat Man terem dizimado as cidades japonesas Hiroshima e Nagasaki, foi fundada a Bulletin of the Atomic Scientists (BAS), uma organização sem fins lucrativos da Universidade de Chicago. Ela visa apontar questões científicas e de segurança global resultantes dos avanços tecnológicos que têm consequências negativas para a humanidade.
Em 1947, os cientistas desenvolveram o Relógio do Juízo Final, uma iniciativa voltada a ser um alerta à humanidade sobre os perigos de uma guerra nuclear com base nas movimentações políticas, mostrando o quão perto a humanidade pode estar de sua extinção. Anualmente, o Conselho de Ciência e Segurança disponibiliza um boletim em que aumentam, diminuem ou mantêm a distância do ponteiro do Relógio para a meia-noite, horário simbólico que representaria a nossa extinção.
Ao longo dos anos, já estivemos 6 vezes próximo do apocalipse, sempre em circunstâncias diferentes. Em 2015, o Relógio do Juízo Final marcou 3 minutos para a meia-noite devido ao significante avanço da Rússia sobre a Ucrânia. Além disso, os russos e estadunidenses espantaram o mundo ao darem início ao processo de modernização de seus programas de armas nucleares. A mudança climática drástica também ergueu preocupação e ajudou a piorar a possibilidade de um futuro.
Mas nunca estivemos tão próximos do apocalipse, visto que em 2023 o BAS posicionou os ponteiros de seu relógio em 90 segundos. E isso está alinhado com o que o cientista Heinz von Foerster acreditava em 1960: a humanidade pode ser extinta até 2026.
O físico austríaco-americano, professor da Universidade de Illinois, nascido em Viena, na Áustria, em 1911, explicou em uma entrevista para a revista Time que a humanidade não vai acabar devido às condições climáticas desesperadoras, a tirania das elites governamentais, tampouco de uma crise econômica destrutiva ou o flagelo de uma doença esmagadora; mas porque a Terra está cheia demais.
Partindo do princípio que prosperidade é igual à morte, von Foerster acredita que a humanidade será espremida até a morte – se até lá não se explodir ou extinguir com a falta de suprimento. Em 2022, a população mundial chegou a 8 bilhões, mostrando como o número disparou ao longo do século XX, escalando rapidamente dos 3 bilhões em 1960.
Há 2 mil anos, havia cerca de 275 milhões de seres vivos, o que mostra que não só a população humana está aumentando, como está o fazendo cada vez mais rápido. As análises prospectivas da Organização das Nações Unidas (OMS) apontam que a população humana chegará a quase 10 bilhões em 2050 e mais de 11 bilhões até 2100. Isso como consequência de uma das maiores taxas de sobrevivência humana em idade reprodutiva, uma das principais causas desse boom populacional – apesar de tudo o que já foi informado sobre a diminuição dos índices de fertilidade nas últimas décadas.
Não só isso é verdade quanto as empresas já estão tentando entender como vão colocar tantas pessoas em centros urbanos, sendo que é estimado que 60% da população mundial esteja vivendo em cidades até 2050. Isso significa que é preciso encontrar moradia para cerca de 2,5 bilhões de pessoas até lá, considerando que o solo urbano se tornou um recurso cada vez mais limitado devido à expansão do setor da agropecuária.
Não é para menos que governos de alguns países estão pensando em alternativas para dar um jeito no problema, como fez a França com seu projeto “Reinvent Paris 2”, que pedia a designers que criassem usos para terrenos urbanos atualmente não utilizados ou subutilizados.
Von Foerster não acreditava na corrente de pensamento do século XIX, que pregava que humanos se reproduziriam ao infinito e que pereceriam devido à falta de recursos, como defendia o economista britânico Thomas Malthus. Ele formulou a “teoria da população” argumentando que os humanos cresceriam em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos cresceria em progressão aritmética, levando eventualmente a crises de fome e escassez.
Atualmente, 40% da terra do planeta é coberta por fazendas industriais, segundo o relatório de 2019 emitido pela Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos, sendo que 60% das terras agrícolas do mundo são utilizadas para a indústria da carne. Até mesmo a melhor tecnologia de alimentos, segundo von Foerster, não pode correr à frente da curva cada vez mais dificultosa que é o crescimento populacional.
O controle de natalidade emerge como uma possível solução para evitar o destino sombrio previsto por von Foerster. Alternativas como a tributação pesada sobre famílias com mais de dois filhos são sugeridas, embora devam ser implementadas considerando o contexto social para evitar a ampliação de desigualdades.
À medida que enfrentamos desafios cada vez mais complexos, desde a segurança global até a sustentabilidade ambiental, é essencial que a humanidade se una em busca de soluções colaborativas e sustentáveis para garantir não apenas a sobrevivência, mas também o florescimento de todas as formas de vida neste planeta. O Relógio do Juízo Final pode ser um lembrete sombrio de nossa vulnerabilidade, mas também deve servir como um chamado à ação para moldarmos um futuro mais seguro e próspero para as gerações vindouras.