Moedas de prata de 2 mil anos revelam segredos de um ataque pirata

A história é frequentemente revelada de maneira surpreendente, como demonstrado pela recente descoberta na Acrópole de San Marco e Santa Teresa, na ilha de Pantelária. Durante trabalhos de restauração na região, uma equipe de arqueólogos da Universidade de Tübingen, da Alemanha, fez uma descoberta extraordinária: 27 moedas de prata romanas que haviam sido escondidas sob uma pedra, enterradas no solo. O achado traz novas luzes sobre um período turbulento da história romana, marcado pela presença de piratas no Mediterrâneo e pela expansão militar romana.

As moedas encontradas datam de 94 a 74 a.C., durante a era republicana romana, um período de intensas campanhas militares e rivalidades políticas. Especula-se que essas moedas foram enterradas propositalmente, talvez para evitar que caíssem nas mãos de piratas que saqueavam a região. O achado foi anunciado em um comunicado oficial pelo Parque Arqueológico de Selinunte e Cave di Cusa de Palermo, através de sua página no Facebook, trazendo grande entusiasmo à comunidade arqueológica.

As moedas e o contexto histórico

Essas moedas romanas, conhecidas como denários de prata, são datadas de um período de grande expansão e conflito na República Romana. Entre 509 a.C. e 27 a.C., Roma passou por grandes mudanças políticas e territoriais, conquistando vastas áreas ao redor do Mediterrâneo e enfrentando ameaças tanto externas quanto internas. Nesse cenário, piratas eram uma presença constante no Mediterrâneo, atacando rotas comerciais e ilhas estrategicamente localizadas, como Pantelária.

O arqueólogo Thomas Schäfer, que lidera as escavações na Acrópole de San Marco há 25 anos, explica que o local onde as moedas foram encontradas tem grande relevância histórica. “San Marco nunca foi tocado por séculos, o que torna as descobertas ainda mais emocionantes”, afirma Schäfer. A região, que era um ponto importante de encontro para decuriões romanos, apresenta vestígios que lançam luz sobre a vida política e militar romana no Mediterrâneo. O termo “Comício”, usado pelos romanos para descrever espaços designados para eleições e debates públicos, reflete a importância desse local para a sociedade romana.

Moedas
 Foto: Parco Archeologico di Selinunte, Cave di Cusa e Pantelleria

Piratas no Mediterrâneo

Durante o período em que as moedas foram cunhadas, as águas do Mediterrâneo eram frequentadas por piratas que saqueavam navios e ilhas, representando uma ameaça constante para o comércio e as rotas militares romanas. A campanha militar de Gneu Pompeu Magno (106-48 a.C.) é um exemplo de como Roma lidava com essa ameaça crescente. Pompeu foi incumbido pelo Senado romano de combater os piratas que devastavam as rotas comerciais e que chegaram a capturar importantes figuras romanas. As frotas de piratas eram tão bem organizadas que chegaram a constituir um poder paralelo no Mediterrâneo, controlando áreas inteiras e cobrando resgates.

Acredita-se que as moedas encontradas em Pantelária foram enterradas por moradores locais ou comerciantes que temiam perder suas riquezas para os piratas. Esse tipo de prática era comum em tempos de guerra ou crise, quando o futuro parecia incerto e a melhor estratégia para proteger seus bens era escondê-los em locais seguros. No entanto, ao que parece, quem quer que tenha enterrado o tesouro nunca teve a chance de recuperá-lo, o que nos deixa com um intrigante mistério histórico.

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O valor arqueológico das moedas

As moedas encontradas em Pantelária não são apenas valiosas por seu conteúdo material, mas também por suas implicações históricas e culturais. Esses denários de prata ajudam os historiadores a reconstruir o contexto comercial, político e militar da região durante a era republicana. Além disso, o fato de terem sido encontradas próximas a outros artefatos romanos, como estátuas de imperadores e imperatrizes, aumenta sua importância para a compreensão da presença romana na Sicília e nas ilhas vizinhas.

O arqueólogo Francesco Scarpinato, conselheiro do Departamento de Patrimônio Cultural e Identidade da Sicília, destacou o valor histórico dessa descoberta. “Este tesouro não é apenas um conjunto de moedas antigas. Ele conta uma história sobre como os romanos lidavam com ameaças, como piratas, e como protegiam suas riquezas em tempos de incerteza”, afirmou. Para Scarpinato, essas moedas oferecem uma janela para o passado, permitindo que os pesquisadores entendam melhor as interações comerciais e as relações de poder que moldaram o Mediterrâneo na época.

O local das descobertas

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 Foto: Parco Archeologico di Selinunte, Cave di Cusa e Pantelleria

A Acrópole de San Marco e Santa Teresa, onde as moedas foram encontradas, é um local de grande valor arqueológico, e a recente descoberta só reforça sua importância. Esta acrópole foi um importante centro de atividades políticas e sociais durante o período romano, com um “Comício” que servia como local para eleições, conselhos e tribunais. Apenas cinco comícios romanos estão preservados em boas condições na Itália, e o de San Marco é o mais bem preservado de todos, segundo Thomas Schäfer.

A descoberta de moedas e outros artefatos em San Marco não é inédita. Em 2010, 107 denários de prata já haviam sido desenterrados na mesma área, reforçando a tese de que a região foi um importante ponto de armazenamento e proteção de riquezas durante tempos de crise. Além das moedas, as estátuas de mármore de imperadores como Júlio César e Vespasiano, e da imperatriz Agripina, também foram encontradas nas proximidades e estão atualmente em exibição em museus na Itália e no Reino Unido.

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A prática de enterrar tesouros para protegê-los em tempos de crise é uma estratégia que remonta a civilizações antigas. O medo de invasões, ataques de piratas e saqueadores era uma constante para os moradores de ilhas como Pantelária, localizadas em rotas comerciais movimentadas. A descoberta das moedas de prata na ilha sugere que alguém, em meio ao caos, buscava preservar suas riquezas de uma possível pilhagem. O fato de essas moedas terem permanecido enterradas por séculos sem serem recuperadas indica que o dono original pode ter sido vítima de uma invasão ou nunca teve a oportunidade de retornar ao local.

Este tesouro escondido é um exemplo de como o medo e a incerteza moldaram as ações das pessoas no passado. Assim como hoje guardamos nossos bens em cofres ou utilizamos sistemas de segurança digital para proteger informações, no passado, as pessoas recorriam a medidas simples, mas eficazes, como enterrar seus tesouros em locais remotos e pouco acessíveis. A arqueologia moderna nos permite recuperar esses pedaços do passado, proporcionando uma visão fascinante sobre as escolhas feitas por aqueles que viveram em tempos de perigo.

Conclusão

A descoberta das 27 moedas de prata romanas na ilha de Pantelária é mais do que um achado arqueológico valioso; é uma janela para um passado marcado por incertezas, conquistas e ameaças constantes. Essas moedas nos contam uma história de medo e proteção, de como os antigos romanos enfrentavam invasões e ameaças externas e de como suas vidas eram moldadas pelas constantes mudanças no cenário político e militar do Mediterrâneo.

Fonte: Revista Galileu