Um episódio grave em Cinfães, distrito de Viseu, levantou novamente o alerta sobre violência infantil nas escolas e os impactos do bullying ignorado. Um menino de nove anos teve a ponta de três dedos amputada após ser agredido por colegas dentro da Escola Básica de Fonte Coberta. A mãe, Nívia Estevam, afirma que vinha alertando a instituição sobre perseguições constantes, mas jamais obteve respostas efetivas. O caso gerou indignação, mobilizou autoridades e abriu investigações internas e externas.
Nívia, brasileira que vive em Portugal há oito anos, relatou ter acionado PSP, Ministério Público e Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ). Segundo ela, o filho sofria insultos, empurrões, puxões de cabelo, pontapés e até tentativas de enforcamento. Nada disso teria recebido providências da escola.
Escalada de violência e amputação dos dedos
O episódio mais grave ocorreu na manhã de 10 de novembro. Durante o intervalo, ao ir ao banheiro, o menino foi perseguido por dois colegas que teriam fechado a porta sobre sua mão. O impacto causou o esmagamento e a amputação das pontas de três dedos. A criança contou à mãe que sangrou muito e, sem conseguir abrir a porta, precisou se arrastar por baixo dela para pedir ajuda.
Nívia afirma que a escola não relatou a gravidade do caso no telefonema inicial. Somente na ambulância, a caminho do Hospital de São João, no Porto, teve noção do estado do filho. A mãe também critica o fato de que, segundo ela, o sangue foi rapidamente limpo e os pedaços dos dedos não foram preservados para possível reimplantação.
Queixas anteriores teriam sido ignoradas
Cinco dias antes do acidente, Nívia havia comunicado à escola que o filho voltou para casa com marca no pescoço após agressões de colegas. A resposta, segundo ela, foi que crianças “podem mentir”. Ela afirma que todas as reclamações anteriores foram tratadas como exagero ou “brincadeiras de criança”.
Após a amputação, as queixas de omissão se intensificaram. Nívia disse que a escola não acionou a polícia e tratou o caso como um incidente comum entre alunos.
Escola abre inquérito interno
O Agrupamento de Escolas de Souselo confirmou apenas que houve um “acidente” e informou que abriu um inquérito interno para apurar os fatos. A direção não comentou as acusações de negligência e omissão anteriores.
A Inspeção-Geral da Educação também iniciou averiguações, a pedido da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares. O diretor da escola garantiu que os socorros foram chamados prontamente, mas evitou detalhar os procedimentos adotados devido à investigação em andamento.
Após tornar o caso público, Nívia relatou ter sido alvo de represálias por parte dos pais das crianças envolvidas. Com medo, decidiu deixar a cidade e mudar-se para outra região de Portugal. Disse temer agressões e represálias em uma comunidade pequena onde “todos se conhecem”.
A mudança inclui a transferência do filho para outra escola, algo que, segundo ela, também causa apreensão devido ao medo de novos episódios, sobretudo pela sensação de xenofobia e racismo que afirma já ter presenciado em algumas regiões.
Ações judiciais e apoio jurídico
A denúncia de Nívia mobilizou um grupo de 15 advogados que se dispôs a acompanhar o caso gratuitamente. Eles atuarão em frentes criminal, administrativa, civil e de responsabilidade da escola pela vigilância.
A equipe jurídica explica que, embora os envolvidos sejam menores de idade, medidas socioeducativas e responsabilização podem ser aplicadas. A intenção é garantir proteção à vítima, apurar falhas de supervisão e exigir que o sistema escolar implemente medidas preventivas mais rigorosas.
O menino já teve alta e segue em casa, em recuperação, com sequelas físicas e emocionais. A mãe diz que “jamais imaginou” algo tão grave acontecendo com o filho e espera que o caso sirva para reforçar a urgência no combate ao bullying nas escolas portuguesas.
Ela afirma que continuará lutando para que os responsáveis sejam punidos e que outras crianças não passem pelo mesmo. “É preciso colocar limites. A violência não pode ser tratada como brincadeira”, reforça.
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