Quando falamos em Fiódor Dostoiévski, os mesmos títulos vêm à mente são: Crime e Castigo, Os Irmãos Karamázov, O Idiota, é natural pois são obras-primas universais. Mas o que poucos leitores sabem é que, por trás dos grandes romances, há diversos livros menos famosos, carregados da mesma profundidade psicológica, existencial e filosófica — às vezes até mais ousados e experimentais.
1. Gente Pobre (1846)
Primeiro romance de Dostoiévski, Gente Pobre foi recebido com entusiasmo pela crítica russa da época, mas acabou ofuscado pelos romances posteriores. Narrado por meio de cartas trocadas entre dois personagens humildes, o livro retrata com lirismo a miséria urbana de São Petersburgo e a dignidade silenciosa de seus protagonistas. É um retrato social de uma Rússia esquecida, feito com sensibilidade crua e poderosa.
2. Netochka Nezvanova (inacabado, 1849)
Pouquíssimo lembrado até entre estudiosos, Netochka Nezvanova seria o primeiro romance psicológico de uma mulher na literatura russa, não fosse a prisão do autor pelo regime czarista. Mesmo incompleto, o livro apresenta uma protagonista complexa, órfã, que vive entre a arte, a carência emocional e as contradições da sociedade. Uma joia incompleta — e por isso mesmo ainda mais fascinante.
3. O Senhor Prokhártchin (1846)
Este conto longo — quase uma novela — narra a história de um velho funcionário público que vive como miserável, mesmo tendo uma pequena fortuna escondida. Com humor ácido e observações cortantes, Dostoiévski já antecipa temas que desenvolveria décadas depois: a obsessão pelo dinheiro, a hipocrisia social e o abismo entre aparência e essência.
4. O Crocodilo (1865)
Escrito com tom de ironia feroz, O Crocodilo é um conto insólito em que um homem é engolido por um crocodilo e passa a viver dentro do animal — de onde continua dando opiniões políticas e filosóficas. A crítica é direta: um ataque aos intelectuais inflados, ao imperialismo e à alienação da elite russa. Uma obra corajosa, quase farsesca, que revela o lado mais sarcástico de Dostoiévski.
5. Uma Criatura Dócil (1876)
Essa novela curta é uma das mais intensas da literatura russa. Um homem narra, em fluxo de consciência, os acontecimentos que o levaram ao suicídio da esposa. Tudo se passa no velório dela. Com tensão crescente e estilo lírico, o texto mergulha em temas como poder, submissão, orgulho e culpa. Uma espécie de autópsia emocional, profundamente perturbadora, que raramente figura entre os títulos mais lidos do autor.
6. Bobók (1873)
Bobók é um conto curto, quase um devaneio delirante. Um homem ouve, acidentalmente, os mortos conversando dentro de um cemitério. Mas esses mortos falam como os vivos: discutem dinheiro, vaidades, intrigas. Com essa premissa fantástica, Dostoiévski critica a decadência moral da sociedade de forma sarcástica e ácida. É uma obra tão estranha quanto genial, e ainda pouco reconhecida em sua potência crítica.
Conclusão
Ao conhecer essas obras escondidas, percebemos que Dostoiévski não foi apenas o criador de grandes narrativas morais e existenciais. Ele também foi um explorador incansável da alma humana, disposto a experimentar formas, vozes e personagens muito além dos arquétipos clássicos. Seus livros menos conhecidos são portas secretas para compreendê-lo em camadas mais íntimas, mais instáveis — e, por isso mesmo, mais humanas.
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