Uma polêmica envolvendo um livro didático alemão tem gerado forte repercussão entre a comunidade brasileira, tanto no Brasil quanto na Alemanha. O livro “ABC der Tiere” (ABC dos Animais, em português), publicado pela editora Mildenberger, descreve um personagem fictício brasileiro, chamado Marco, de maneira estereotipada e cruel, causando indignação em pais e educadores.
A obra é voltada para crianças do quarto ano do ensino fundamental e tem como objetivo ensinar o alfabeto de forma lúdica, utilizando personagens e cenários do cotidiano.
No entanto, a descrição de Marco, um menino que, segundo o livro, “não vai à escola, busca restos de comida no lixo de manhã e quer ser jogador de futebol”, foi considerada profundamente ofensiva. A referência ao Rio de Janeiro, cidade natal do personagem, amplificou ainda mais a sensação de preconceito, vinculando a imagem do Brasil à pobreza, à marginalização e à falta de oportunidades, de forma simplista e sem contexto.
A repercussão nas redes sociais foi imediata. Pais e membros da comunidade brasileira na Alemanha denunciaram a obra como um exemplo claro de preconceito e racismo. Muitos afirmam que a imagem negativa disseminada no livro pode ter gerado episódios de bullying entre crianças, afetando a autoestima de estudantes brasileiros.
Relatos de pais indicam que seus filhos, ao serem identificados como “brasileiros”, se tornaram alvo de ataques verbais e gestos preconceituosos, com colegas de classe chegando a oferecer-lhes comida durante o intervalo, como se a descrição do livro fosse uma realidade para todos os brasileiros.
A editora Mildenberger, diante da pressão, se posicionou publicamente, pedindo desculpas à comunidade brasileira. Em uma postagem nas redes sociais, afirmou que “nunca foi nossa intenção reforçar estereótipos negativos ou transmitir uma representação unilateral” do Brasil.
No entanto, a resposta não foi suficiente para aplacar a revolta. A editora anunciou que uma versão corrigida da página do livro foi disponibilizada na versão digital, mas não informou se o material físico será reimpresso com alterações.
Na nova versão digital, o personagem Marco ainda é descrito como um carioca, mas a narrativa foi suavizada. Em vez de afirmar que ele “não vai à escola”, agora a história destaca que sua matéria preferida é educação física e que ele sonha em ser jogador de futebol, um ideal comum entre muitos jovens, mas que, mesmo assim, não justifica a forma como o personagem foi inicialmente retratado.
Esse episódio revela uma discussão mais profunda sobre a responsabilidade das editoras e dos materiais didáticos na construção de representações culturais. O papel das editoras, especialmente em livros usados por crianças em formação, vai além da simples educação acadêmica.
Essas obras também formam a percepção dos pequenos sobre diferentes culturas e povos, e, ao distorcerem ou simplificarem de maneira negativa a realidade de uma nação, podem perpetuar estigmas prejudiciais.
Além disso, é importante refletir sobre a relevância de uma abordagem inclusiva e diversa nos materiais educacionais. O caso com “ABC der Tiere” evidencia a necessidade de um cuidado redobrado ao tratar de temas tão sensíveis e da urgência de promover uma educação que valorize a pluralidade, a empatia e o respeito pelas diferentes realidades culturais e sociais.
A polêmica gerada por “ABC der Tiere” não apenas expôs uma falha na abordagem de estereótipos culturais, mas também abriu um debate necessário sobre os limites da representatividade e o impacto das palavras na formação de crianças.
O caso serve como alerta para a necessidade de revisitar constantemente o conteúdo educativo oferecido aos alunos, garantindo que ele seja não apenas informativo, mas também respeitoso e capaz de promover uma visão mais equilibrada e justa do mundo.