A história de um leitor pode ser contada pela forma como ele cuida dos livros, pelas anotações nas margens das páginas e pelos títulos que acompanha ao longo de uma vida inteira. No caso de Dan Pelzer, um americano que morreu em julho de 2025 aos 92 anos, a paixão virou memória eterna. Durante seis décadas, ele anotou manualmente cada livro que leu, formando uma lista extraordinária com 3.599 obras. O material, preservado com cuidado, agora serve de inspiração para leitores que o conhecem apenas por sua herança literária.
Compartilhada pela família através do site “Dan leu”, a lista inclui desde ficções contemporâneas até clássicos universais, passando por biografias, obras religiosas, teorias econômicas, romances históricos, análises políticas e livros sobre ciência e filosofia. Escaneada e publicada após seu falecimento, a coleção foi acessada por quem participou do funeral, graças a um QR Code impresso no programa de despedida. O gesto transformou um simples caderno antigo em uma homenagem silenciosa a uma vida inteira dedicada à leitura. Acesse o site: https://what-dan-read.com

Uma vida contada pelos livros
O hábito de registrar leituras, tão comum hoje em plataformas digitais, existia para Dan muito antes da internet. Ele não lia apenas por hobby: lia com disciplina. Até mesmo livros que não apreciava eram concluídos sem exceção. Obras complexas como Ulisses, de James Joyce, e a série Missão Terra, de L. Ron Hubbard, foram vencidas com a mesma persistência que mais tarde o levou a encerrar sua trajetória literária com David Copperfield, de Charles Dickens.
A penúltima obra lida por Dan revela seu interesse por narrativas atuais: o romance Tomorrow, and Tomorrow, and Tomorrow, de Gabrielle Zevin. Ele lia em qualquer lugar — ônibus, trabalho, biblioteca — sempre acompanhado de um livro. O vínculo com a Biblioteca Metropolitana de Columbus era tão profundo que a instituição montou uma exposição com algumas das obras presentes em sua lista. A coleção completa agora está passando por digitalização.
Livros que moldaram escolhas e convicções
A leitura também foi um ponto de fuga e de transformação pessoal. Dan cresceu em uma família instável, estudou em um colégio católico em Detroit e se tornou o primeiro da família a concluir uma faculdade. Passou pelos Fuzileiros Navais e tentou a vida religiosa antes de se tornar assistente social em um centro juvenil de correção. Nos anos 1980, dedicou-se a obras sobre saúde mental de adolescentes, movido pelos desafios que enfrentava na profissão.
Também era um leitor movido por princípios. Liberal, estudava ecologia, filosofia e política. Sua dieta vegana foi influenciada pelo livro Como Evitar um Desastre Climático, de Bill Gates. Conversava sobre livros com entusiasmo e tinha o hábito de revisitar a Bíblia, embora ela não apareça em sua lista — mesmo após doze leituras completas, segundo relatos da família.
A leitura como herança
A lista de Dan ganhou relevância nacional em 2006, quando o Columbus Dispatch mostrou que ele já lia cerca de 80 livros por ano. Após sua morte, tornou-se patrimônio afetivo. No LinkedIn, sua filha Marci definiu os registros como “a herança mais preciosa” da família. No obituário, ela dispensou flores e pediu aos amigos que homenageassem seu pai de outro modo: lendo “um livro que prenda a atenção”.
Nesse gesto simples, a família reafirmou o legado de Dan: mais do que acumular números, ele viveu pela curiosidade e pela paixão de conhecer o mundo através das páginas. Ao compartilhar sua lista, sua história passou a ecoar entre leitores que talvez nunca o encontrem, mas que podem agora, inspirados por ele, abrir um novo livro e começar sua própria contagem.
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