Encontrado um forno dos Neandertais com 65 mil anos

Uma descoberta fascinante em Gibraltar está remodelando a visão do mundo sobre os neandertais, nossos primos ancestrais frequentemente subestimados. Pesquisadores da Universidade de Múrcia identificaram, na Caverna Vanguard, um forno de destilação de alcatrão com 65 mil anos de idade, marcando um feito tecnológico sem precedentes na história pré-histórica.

Esse achado destaca não apenas a complexidade cognitiva dos neandertais, mas também sua capacidade de resolver problemas e inovar em um nível que rivaliza com o dos primeiros Homo sapiens.

O forno, localizado em uma caverna que faz parte do Complexo de Gorham, reconhecido como Patrimônio Mundial da UNESCO, foi projetado especificamente para extrair alcatrão de plantas resinosas. Este material era utilizado como adesivo para fixar ferramentas de pedra a cabos de madeira, uma inovação que precede técnicas humanas modernas em mais de 100 mil anos.

A sofisticação do projeto desafia antigos estereótipos que retratavam os neandertais como brutos simplórios. Esta descoberta não só enriquece a compreensão sobre suas habilidades, mas também reforça a importância do fogo como ferramenta tecnológica e cultural.

A tecnologia avançada da Caverna Vanguard

O forno de alcatrão encontrado na Caverna Vanguard é um testemunho notável da engenhosidade dos neandertais. Escavado cuidadosamente em uma lareira especializada, o forno possuía uma área central de fogo, ladeada por trincheiras e coberta por uma mistura de guano e areia. Esse design criava um ambiente de baixo oxigênio, essencial para extrair alcatrão sem destruir as plantas resinosas usadas no processo.

Análises científicas realizadas no local detectaram compostos como levoglucosan e retene, substâncias que indicam a combustão controlada de plantas resinosas, especialmente da família Cistaceae, como a esteva. A temperatura controlada do forno, mantida abaixo de 500°C, era fundamental para preservar a integridade do alcatrão. Esses achados demonstram que os neandertais possuíam um conhecimento detalhado da manipulação do fogo, usando-o não apenas para aquecimento ou cozimento, mas também para fins tecnológicos sofisticados.

O papel do alcatrão na vida neandertal

O alcatrão produzido pelos neandertais na Caverna Vanguard tinha uma função prática e crucial: servia como adesivo para fixar ferramentas de pedra em cabos de madeira, criando armas e utensílios mais eficazes. Essa inovação representava uma vantagem significativa na caça e nas atividades do dia a dia.

A produção de alcatrão exige planejamento, materiais específicos e a habilidade de controlar o fogo em condições precisas. Isso indica que os neandertais não apenas entendiam as propriedades das plantas resinosas, mas também eram capazes de conceber e executar estruturas complexas para atender às suas necessidades. A descoberta desse processo na Caverna Vanguard demonstra que eles eram inventivos e adaptáveis, desafiando narrativas ultrapassadas que os colocavam como inferiores aos Homo sapiens.

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Fogo controlado e planejamento avançado

A construção do forno de alcatrão na Caverna Vanguard reflete um nível impressionante de planejamento e habilidades cognitivas. A análise micromorfológica da lareira revelou que os neandertais usavam métodos para garantir condições ideais de combustão, incluindo a adição deliberada de plantas específicas ao fogo. Isso sugere um profundo entendimento das propriedades químicas e físicas do material vegetal.

Arqueólogos experimentais recriaram o processo de destilação usando ferramentas e materiais disponíveis na época dos neandertais. Os resultados confirmaram que o design do forno era eficaz, produzindo alcatrão suficiente para ser usado em pontas de lança de pedra. Essa validação experimental reforça a ideia de que os neandertais não apenas dominavam o fogo, mas também tinham a capacidade de aplicar esse conhecimento em projetos técnicos de longo prazo.

Desafios aos estereótipos sobre os neandertais

A descoberta na Caverna Vanguard representa uma virada na percepção sobre os neandertais. Durante muito tempo, eles foram retratados como primitivos e intelectualmente inferiores aos Homo sapiens. No entanto, o forno de destilação de alcatrão revela uma cultura sofisticada, capaz de criar soluções tecnológicas avançadas e de transmitir conhecimento entre gerações.

Além disso, o uso do fogo para destilação destaca uma compreensão complexa de processos químicos e físicos, desafiando a ideia de que os neandertais eram meramente imitadores das técnicas humanas modernas. Essa descoberta se junta a uma série de outras evidências arqueológicas que comprovam a habilidade dos neandertais de inovar e se adaptar ao ambiente, solidificando seu lugar como uma espécie engenhosa e resiliente.

Impactos na arqueologia e na ciência moderna

O achado do forno de alcatrão em Gibraltar tem implicações profundas para a arqueologia e para a compreensão da evolução humana. Ele redefine o que sabemos sobre as capacidades dos neandertais e destaca a importância de explorar mais profundamente os sítios pré-históricos em busca de evidências de comportamentos complexos.

A pesquisa também reforça a relevância de métodos experimentais na arqueologia, permitindo que cientistas testem hipóteses sobre como nossos ancestrais viviam, trabalhavam e inovavam. Essas descobertas ajudam a construir uma narrativa mais rica e inclusiva da evolução humana, reconhecendo as contribuições dos neandertais para a história da tecnologia e da cultura.