A arqueologia muitas vezes nos transporta para tempos remotos, revelando histórias escondidas em objetos aparentemente simples. Uma dessas descobertas surpreendentes ocorreu em Adrianópolis, região de Eskipazar, Turquia, onde um amuleto do século V d.C. chamou a atenção de estudiosos e entusiastas.
A peça, adornada com a imagem do Rei Salomão derrotando o diabo, carrega um simbolismo profundo e liga-se a um capítulo apócrifo da Bíblia, o “Testamento de Salomão”. Este texto, excluído do cânone cristão, mergulha em temas místicos que envolvem magia, controle de demônios e o poder espiritual do lendário rei. A descoberta não apenas destaca o sincretismo religioso da época, mas também abre portas para entendermos as crenças e práticas espirituais no final do Império Romano.
Adrianópolis, conhecida como um importante centro religioso e militar, era lar de diferentes tradições culturais e espirituais. A figura de Salomão, reverenciada em três grandes religiões abraâmicas, aparece neste artefato como um protetor espiritual, reforçando a conexão entre práticas religiosas e proteção militar.
A inscrição “Nosso Senhor venceu o mal” na face do amuleto e os nomes de arcanjos em sua parte traseira sugerem que ele era usado como um talismã de proteção divina, talvez por soldados da cavalaria romana ou bizantina.
O amuleto apresenta o Rei Salomão montado a cavalo, uma imagem rara que reforça a narrativa de vitória contra forças malignas. Este simbolismo não é apenas religioso, mas também militar. Salomão é frequentemente retratado como uma figura de sabedoria e poder, mas sua associação com a cavalaria romana e bizantina aponta para um papel protetor.
De acordo com os pesquisadores, a inscrição “Nosso Senhor venceu o mal” sugere que o amuleto era um objeto de fé pessoal, usado para afastar energias malignas e proteger quem o portava. A gravura nos remete ao “Testamento de Salomão”, onde o rei, com a ajuda do arcanjo Miguel, recebe um anel mágico que lhe dá poder sobre os demônios. Essa narrativa apócrifa foi escrita entre os séculos I e V d.C., mas não foi incluída no cânone bíblico devido ao seu foco em temas como demonologia e práticas mágicas.
O “Testamento de Salomão” é um texto apócrifo intrigante que narra como o rei recebeu um anel mágico do arcanjo Miguel, conferindo-lhe o poder de invocar, interrogar e subjugar demônios. Este capítulo, amplamente excluído da Bíblia, revela uma faceta diferente do rei. Embora seja retratado como um governante sábio na Torá, na Bíblia e no Alcorão, o texto apócrifo o coloca como um combatente direto das forças malignas, um mediador entre o mundo espiritual e humano.
Essa narrativa reflete o sincretismo religioso da época, onde crenças judaicas, cristãs e pagãs se entrelaçavam. O uso de amuletos com conotações divinas era comum, especialmente entre soldados que enfrentavam batalhas perigosas. Neste contexto, Salomão surge como uma figura de autoridade espiritual e militar, conferindo proteção e força aos fiéis.
O amuleto encontrado em Adrianópolis possui inscrições que reforçam seu propósito como objeto sagrado. Os nomes dos arcanjos Azrael, Gabriel, Miguel e Israfil estão gravados na parte de trás, sublinhando seu papel de proteção divina. Cada arcanjo carrega simbolismos específicos: Miguel é o guerreiro celestial, Gabriel o mensageiro divino, Azrael o anjo da morte, e Israfil, conhecido no islamismo, é associado ao sopro final no Dia do Juízo.
Essas inscrições mostram como a espiritualidade da época incorporava elementos das três grandes religiões abraâmicas, refletindo um sincretismo único. A presença desses nomes no amuleto indica que ele era mais do que um objeto decorativo; era uma ferramenta de proteção espiritual e conexão divina.
A localização do amuleto em Adrianópolis é significativa. Esta cidade, no coração do Império Romano Tardio, era um ponto de encontro de diferentes culturas e religiões. Pesquisas anteriores indicaram a presença de uma unidade de cavalaria na região, sugerindo que o amuleto pode ter pertencido a um soldado. O uso de Salomão como figura protetora para militares é um exemplo de como crenças religiosas se adaptavam às necessidades práticas da época.
Adrianópolis também exemplifica o sincretismo religioso, onde tradições judaicas, cristãs e pagãs se misturavam. O amuleto é uma prova tangível dessa mistura, combinando elementos do “Testamento de Salomão” com práticas espirituais locais.
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