A descoberta de moedas de ouro em um campo no leste da Holanda levou arqueólogos a um dos achados mais intrigantes da história medieval europeia. Pesquisadores identificaram um antigo local de culto em Hezingen, onde práticas religiosas pagãs coexistiram com a transição para o cristianismo. Essa descoberta lança nova luz sobre as mudanças culturais que moldaram a Idade Média.
O que foi encontrado no sítio arqueológico de Hezingen?
Um grupo de entusiastas de detectores de metais encontrou várias moedas antigas em um campo no leste da Holanda. A investigação arqueológica subsequente revelou um complexo cerimonial com um anel de 17 buracos de postes de madeira, um edifício incomum e indícios de uma residência nobre, sugerindo que o local era frequentado por elites locais para rituais religiosos.
Além das moedas, foram encontrados objetos de ouro e prata, provavelmente usados como oferendas a divindades pré-cristãs. O alinhamento preciso das estruturas com os equinócios indica que o local possuía um papel central em celebrações agrícolas sazonais.
O que é o ‘dinheiro do diabo’?
O termo diobolgeldæ, ou “dinheiro do diabo”, era utilizado por missionários cristãos para descrever as moedas de ouro e prata oferecidas em rituais pagãos. Para os novos religiosos, tais oferendas eram consideradas heréticas, representando uma prática a ser combatida e eliminada com a difusão do cristianismo.
As moedas descobertas em Hezingen eram tremisses, pequenas moedas de ouro comuns na Europa entre os séculos VI e VIII. A presença desses itens sugere que o local era usado por grupos de alto status para rituais religiosos e, possivelmente, para afirmar seu poder e influência na comunidade.
Qual era a religião praticada antes do cristianismo?
Antes da chegada dos missionários cristãos, a região abrigava cultos germânicos e saxões. A promessa batismal saxônica do século IX menciona três deidades: Wodan (Odin), Thunær (Thor) e Saxnōte (Saxnot), indicando que essas divindades poderiam ter sido adoradas em Hezingen.
Os arqueólogos acreditam que os habitantes locais realizaram rituais em homenagem a essas divindades, possivelmente envolvendo sacrifícios simbólicos e oferendas para garantir boas colheitas e proteção divina.
Por que o local foi abandonado?
A pesquisa sugere que Hezingen foi abandonado no final do século VII ou início do século VIII, coincidindo com a chegada dos primeiros missionários cristãos na região. Isso indica que os cultistas locais podem ter sido alguns dos primeiros a se converterem à nova fé.
Outras hipóteses para o fim do local incluem:
- Intervenção cristã: missionários podem ter destruído ou profanado o santuário.
- Saqueadores: objetos valiosos podem ter atraído ladrões.
- Mudança cultural espontânea: a comunidade pode ter abandonado os antigos rituais em favor da nova religião por influência externa.
O que essa descoberta revela sobre a transição religiosa medieval?
A descoberta do sítio de Hezingen ilustra como a conversão ao cristianismo na Europa medieval não foi abrupta, mas sim um processo gradual e complexo. O estudo revela que rituais pagãos e cristãos coexistiram por um tempo antes da nova fé se consolidar.
O professor Jan-Willem de Kort, da Agência do Patrimônio Cultural da Holanda, enfatiza a importância de estudar essas descobertas sem preconceitos: “Os resultados devem ser estudados com uma mente aberta. Descobertas de tesouros devem ser abordadas, antes de tudo, como sítios arqueológicos.”
A descoberta em Hezingen oferece uma visão única sobre a vida religiosa e social na Europa medieval. O estudo do dinheiro do diabo e das oferendas pagãs reforça a necessidade de preservar sítios arqueológicos e compreender como as crenças evoluíram ao longo do tempo.
Enquanto o cristianismo eventualmente dominou a região, as evidências arqueológicas mostram que a transição foi marcada por um período de sincretismo e resistência cultural. Proteger esses vestígios históricos permite que novas gerações compreendam melhor as raízes das tradições e crenças que moldaram a sociedade moderna.