Nos últimos 10 anos, o Brasil tem vivido um aumento assustador nos atendimentos a crianças e adolescentes com transtornos de ansiedade, conforme dados do Ministério da Saúde. Entre as crianças de 10 a 14 anos, o número de atendimentos no SUS cresceu 1.575%. Entre os adolescentes de 15 a 19 anos, o avanço foi ainda mais chocante: de 4.423%, com o número de atendimentos saltando de 1.534 em 2014 para impressionantes 53.514 no último ano.
Mas o que está por trás desse crescimento exponencial? De acordo com especialistas, o impacto da tecnologia e, principalmente, o uso excessivo de celulares e dispositivos eletrônicos, é um dos principais fatores que contribuem para o agravamento da saúde mental dessa nova geração. O pediatra e sanitarista Daniel Becker explica que o problema é multifacetado. Para ele, o uso excessivo de aparelhos compromete aspectos importantes da vida das crianças e dos jovens. A falta de atividade física, a diminuição da interação social e a perda de momentos essenciais, como brincadeiras e esportes, são consequências diretas dessa dependência.
Além disso, há o problema do conteúdo consumido nas redes sociais. Becker é categórico ao afirmar que o algoritmo das plataformas sociais não favorece conteúdos positivos, mas sim “o maior lixo possível”, como ele mesmo define. O que acaba acontecendo é que, sem uma supervisão adequada, as crianças e adolescentes são bombardeados com conteúdos fúteis, agressivos, ideologicamente inadequados, e até com temas como bullying, racismo, misoginia e pornografia. E o mais alarmante: eles não sabem como filtrar essas informações.
Esse cenário se agrava ainda mais para as meninas, como explica o pediatra. As redes sociais promovem um padrão de beleza irreal, com influenciadoras e celebridades que exibem corpos transformados por filtros, cirurgias e tratamentos estéticos. Para Becker, isso é uma verdadeira receita para a depressão, gerando insegurança e distúrbios psicológicos profundos.
Outro fator que impacta diretamente o bem-estar dos jovens é o sono. O presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, Clóvis Francisco Constantino, alerta que o uso excessivo de telas, especialmente antes de dormir, prejudica a qualidade do sono, fator essencial para o equilíbrio emocional. O impacto disso é um agravamento de questões já existentes, como a ansiedade e a depressão, já tão prevalentes entre os jovens.
O problema, portanto, não é apenas o tempo que se passa na frente das telas, mas o conteúdo consumido e a ausência de equilíbrio nas atividades do dia a dia. Constantino destaca a importância de os pais e cuidadores estabelecerem limites claros e incentivarem os filhos a se engajarem em atividades ao ar livre, longe das telas. A saúde emocional da nova geração precisa ser tratada com urgência, e o uso consciente da tecnologia pode ser um grande aliado nesse processo.