O avanço dos casos de intoxicação por metanol em bebidas alcoólicas adulteradas acendeu o alerta no país. Segundo o Ministério da Saúde, já são 47 casos confirmados e 57 sob investigação, com oito mortes registradas — seis em São Paulo e duas em Pernambuco. O cenário vem preocupando tanto autoridades quanto o setor de bares e restaurantes, que busca alternativas para reconquistar a confiança do público e evitar novas tragédias.
Entre as medidas adotadas, surge uma solução preventiva: a perícia química em bebidas, serviço especializado que analisa e certifica a pureza do álcool comercializado. Em São Paulo, o químico e perito forense Guilherme Lima tem se tornado referência nesse tipo de consultoria, oferecendo laudos que comprovam a ausência de metanol em produtos vendidos por bares e restaurantes.
“Já realizamos perícia preventiva em quatro estabelecimentos da capital, todos buscando mostrar ao cliente que prezam pela segurança e transparência”, relata Lima, que possui pós-graduação em Química Ambiental, Química Forense e Engenharia de Avaliação e Perícia.
Como funciona a perícia contra metanol
A análise começa pela verificação dos rótulos e lotes das garrafas, que precisam corresponder às notas fiscais. Em seguida, o perito coleta uma amostra — geralmente 100 mililitros — e envia a um laboratório parceiro para testes detalhados.
O procedimento utiliza uma técnica chamada Cromatografia Gasosa acoplada à Espectrometria de Massas (GC-MS), um método de alta precisão que permite detectar níveis minúsculos de metanol. Essa combinação separa os compostos presentes na bebida e identifica, pela massa molecular, se há substâncias tóxicas.
O laudo, que costuma levar cerca de dez dias úteis, informa se o produto está livre de contaminação. Segundo Lima, o custo da perícia varia de R$ 2 mil a R$ 7 mil, dependendo da quantidade de bebidas analisadas e da frequência das coletas. “Com a perícia preventiva, os bares demonstram compromisso com a saúde pública e evitam prejuízos à reputação”, explica.
O metanol (CH₃OH) é um álcool industrial altamente tóxico, usado na fabricação de solventes e combustíveis. Mesmo pequenas quantidades podem ser fatais. De acordo com a Sociedade Brasileira de Química (SBQ), a ingestão de 1 a 2 mL por quilo de peso corporal pode levar à morte, e doses menores já causam cegueira permanente.

O problema está no metabolismo: o fígado transforma o metanol em formaldeído e ácido fórmico, substâncias extremamente nocivas ao sistema nervoso e aos olhos. Os sintomas iniciais se confundem com uma simples ressaca — dor de cabeça, tontura e náusea —, mas evoluem rapidamente para perda de visão, confusão mental, convulsões e coma.
“É praticamente impossível detectar o metanol a olho nu”, alerta Lima. “Ele não altera cor, cheiro nem sabor. Por isso, bebidas destiladas, como cachaças, vodcas e whiskies, são as mais visadas pelos falsificadores.”
A crise nos bares e os impactos econômicos
A repercussão dos casos já impacta o setor. Dados da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) mostram que o consumo em bares caiu 4,9% em setembro em relação a agosto, e 3,9% na comparação anual. Muitos estabelecimentos agora buscam certificações para garantir aos clientes que seus produtos são seguros.
“Quando um bar apresenta um laudo de perícia química, ele transmite confiança e mostra que está comprometido com boas práticas”, explica o perito. A medida também ajuda a reduzir o risco de interdições e ações judiciais — cada vez mais comuns após as denúncias de bebidas adulteradas.
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As investigações e a prevenção
Enquanto a perícia preventiva cresce, a perícia criminal segue apurando os casos com vítimas fatais. Nesses casos, são coletadas amostras de sangue, urina, fígado, pulmão e estômago para exames toxicológicos completos. O objetivo é determinar se o metanol foi adicionado de forma intencional ou acidental.
De acordo com o Ministério da Saúde, ainda há dúvidas se as contaminações recentes decorrem de falsificação deliberada ou do uso indevido do metanol na higienização de garrafas. Em ambos os cenários, o risco é o mesmo.
Fonte: Revista Galileu



