Imagine segurar nas mãos um objeto que pertenceu a alguém há mais de 500 anos. Agora, pense nesse objeto “tentando escapar” de você, subindo rapidamente em direção à superfície após séculos preso no fundo do mar. Foi exatamente isso que aconteceu com o arqueólogo marinho Brendan Foley durante uma escavação no naufrágio do Gribshunden, uma nau capitânia real dinamarquesa que afundou em 1495. Essa descoberta surpreendente é apenas a ponta do iceberg de um tesouro arqueológico que está reescrevendo a história da navegação e da cultura nórdica.
O que é o Gribshunden e por que ele é tão importante?
O Gribshunden era a nau capitânia do Rei Hans da Dinamarca e Noruega, um navio que simbolizava poder, riqueza e ambição política. Em 1495, enquanto o rei viajava para uma cúpula política em Kalmar, na Suécia, o navio afundou devido a uma explosão de pólvora. O Gribshunden não era apenas um meio de transporte; era um castelo flutuante, carregando consigo artefatos valiosos, armas, especiarias exóticas e símbolos de poder que refletiam a influência do rei na região nórdica.
A importância do Gribshunden vai além de seu valor histórico. Ele representa a transição para uma nova era de navegação, marcada por navios maiores e mais armados, que permitiram aos europeus explorar e colonizar partes distantes do globo.
Como uma caneca de 500 anos “tentou escapar”?
Durante uma das expedições ao naufrágio, Brendan Foley avistou uma caneca de madeira presa sob um emaranhado de lenha. Ao tentar limpá-la, a caneca começou a se mover sozinha, liberando bolhas de gás presas em seu interior. Essas bolhas eram resquícios da decomposição da cerveja ou hidromel que a caneca continha há mais de cinco séculos.
“Eu nunca tinha visto um artefato tentar escapar antes”, disse Foley. A caneca, feita de uma única peça de madeira de amieiro e originalmente pintada de vermelho, é um artefato único. Seu interior ainda exala um leve cheiro de pinho, sugerindo que pode ter contido uma cerveja com sabor dessa madeira.
O que mais foi encontrado no naufrágio?
A escavação do Gribshunden revelou uma coleção impressionante de artefatos que estão ajudando os arqueólogos a entender melhor a vida a bordo de navios reais no final do século XV. Entre os achados estão:
- Armas medievais: Bestas de madeira intactas e armas de fogo antigas, que marcam o início da transição para o uso de pólvora.
- Moedas de prata: Uma bolsa de moedas que indica a mudança das economias de escambo para o uso de dinheiro.
- Especiarias exóticas: Cravos, pimentas em grão, gengibre e açafrão, importados de lugares distantes como a Indonésia, provavelmente para banquetes reais.
- Objetos pessoais: Itens como a caneca de madeira, que oferecem uma conexão direta com as pessoas que estavam a bordo.
Por que o Mar Báltico preserva tão bem os naufrágios?
A baixa salinidade do Mar Báltico cria um ambiente único que impede a proliferação de vermes carnívoros, responsáveis por devorar madeira em outros oceanos. Isso permite que navios como o Gribshunden permaneçam incrivelmente bem preservados, mesmo após séculos submersos.
O que o Gribshunden revela sobre a história nórdica?
O Gribshunden não era apenas um navio de guerra; era um centro administrativo, cultural e político flutuante. Os artefatos encontrados a bordo mostram como o Rei Hans usava o navio para projetar poder e influência. As especiarias exóticas, por exemplo, indicam conexões comerciais com o Oriente, enquanto as armas refletem a importância militar da época.
Qual o futuro das pesquisas no Mar Báltico?
Brendan Foley e sua equipe escavaram apenas entre 1% e 2% do naufrágio, o que significa que ainda há muito a ser descoberto. Foley também está interessado em explorar outros mares, como o Mar Negro e o Mar Cáspio, onde condições semelhantes de preservação podem revelar novos tesouros arqueológicos.
O naufrágio do Gribshunden é uma janela para o passado, oferecendo insights valiosos sobre a vida, a política e a cultura do final do século XV. Cada artefato recuperado, desde a caneca que “tentou escapar” até as especiarias exóticas, conta uma história fascinante sobre como as pessoas viviam, negociavam e lutavam naquela época. Para Foley, essas descobertas não são apenas objetos; são “chamadas telefônicas” do passado, que nos ajudam a reconstruir a história da humanidade.