Elas não têm voz, não têm ouvidos e tampouco celulares. Mas se engana quem pensa que as árvores vivem em silêncio absoluto. Por debaixo do solo, onde os olhos humanos não alcançam, um complexo sistema de conexão entre raízes e fungos revela que as florestas possuem uma forma própria de comunicação — sofisticada, silenciosa e absolutamente fascinante. E, sim, há quem já a tenha apelidado de “Wood Wide Web”: a internet natural das árvores.
Este artigo mergulha nos bastidores biológicos do subsolo para explicar como as árvores “conversam”, trocam nutrientes, emitem alertas e cuidam umas das outras de maneira que mais parece ficção científica — mas é ciência pura, com base em décadas de pesquisa ecológica.
Fungos e raízes: a base do sistema de comunicação vegetal
O principal responsável por essa comunicação é um tipo especial de fungo conhecido como micorrízico. Esses fungos se associam às raízes das árvores formando uma rede subterrânea de fios ultrafinos chamados hifas. Essa simbiose, além de ajudar na absorção de nutrientes, também permite que as árvores “enviem” e “recebam” informações.
A rede de micélios funciona como uma central de transmissão: ela conecta diferentes árvores — inclusive de espécies distintas — permitindo que compartilhem recursos como água, carbono, fósforo e nitrogênio. É como se houvesse um sistema de correio ecológico oculto sob os nossos pés.
Mensagens químicas: como as árvores alertam sobre ameaças
Um dos aspectos mais surpreendentes dessa comunicação subterrânea é a capacidade das árvores de enviar alertas. Quando uma árvore é atacada por pragas, ela libera compostos químicos por suas raízes, que são absorvidos pelos fungos e transportados até outras árvores da mesma rede. Essas “árvores vizinhas” respondem ativando seus próprios mecanismos de defesa, como o aumento da produção de taninos — substâncias que deixam as folhas menos apetitosas para os invasores.
É uma forma de inteligência coletiva vegetal, em que o bem-estar do grupo parece se sobrepor ao instinto individual. Uma espécie de solidariedade orgânica onde o aviso de perigo se propaga em cadeia, promovendo proteção comunitária.
Transferência de nutrientes entre árvores: cooperação em vez de competição
Em contraste com a ideia de que a natureza é dominada por competição acirrada, as florestas nos mostram um outro lado: o da colaboração. Árvores adultas e saudáveis muitas vezes compartilham nutrientes com mudas mais jovens, especialmente quando estas crescem em locais sombreados e têm dificuldade de fazer fotossíntese. Esse gesto altruísta pode garantir a sobrevivência das novas gerações e perpetuar a diversidade da floresta.
Pesquisas lideradas pela ecóloga canadense Suzanne Simard, pioneira nesse campo, mostraram que as árvores mais velhas agem como “árvores-mãe”, sustentando a floresta ao seu redor ao alimentar as menores e até “enviando” carbono para elas em tempos de escassez.
A rede subterrânea e o impacto das ações humanas
Infelizmente, esse sistema delicado é altamente vulnerável à intervenção humana. Quando uma árvore é cortada ou removida sem planejamento ecológico, a rede micorrízica pode ser destruída em grande parte. Isso afeta a saúde do solo e rompe a comunicação entre as árvores remanescentes.
Da mesma forma, práticas como o uso excessivo de fertilizantes, pesticidas e a compactação do solo por máquinas pesadas prejudicam os fungos micorrízicos, tornando as florestas menos resilientes a mudanças climáticas, doenças e desequilíbrios ecológicos.
Como essa descoberta pode mudar nossa relação com as florestas
Saber que as árvores trocam informações e recursos por meio de uma rede invisível e viva reforça a urgência de um novo olhar sobre os ecossistemas. A floresta não é apenas um aglomerado de árvores isoladas, mas um organismo coletivo, interligado por conexões sensíveis que sustentam a vida vegetal e animal como um todo.
Essa descoberta transforma a maneira como devemos cuidar do meio ambiente. Preservar uma floresta vai muito além de manter as copas intactas — é necessário também proteger o que está sob os nossos pés.
A ideia de que árvores conversam entre si pode soar poética, mas é, acima de tudo, científica. A natureza desenvolveu um sistema de interdependência onde cada árvore, cada raiz, cada fungo, é parte de um todo inteligente. Enquanto seguimos conectados pelas redes digitais, as florestas seguem se comunicando por cabos biológicos invisíveis — uma verdadeira internet natural que pulsa sob a terra.
Entender e respeitar esse sistema é essencial para que possamos viver em equilíbrio com o planeta. Porque, no fim das contas, quando as árvores falam, a Terra responde.