Poucos filmes conseguem provocar tanta discussão quanto Ilha do Medo (Shutter Island), dirigido por Martin Scorsese. A produção, estrelada por Leonardo DiCaprio, envolve o espectador em uma trama de paranoia, trauma e manipulação psicológica. E é justamente no desfecho que o longa atinge seu ponto máximo: uma revelação que transforma tudo o que vimos. Analisar esse final é compreender como a história dialoga com dor, culpa e o frágil limite entre realidade e delírio.
O que o filme revela nos minutos finais
O clímax acontece quando Teddy Daniels, até então um agente federal investigando o desaparecimento de uma interna, descobre que nada daquilo era real. Ele não é detetive, mas sim Andrew Laeddis, paciente do hospital psiquiátrico. Toda a investigação fazia parte de um experimento terapêutico para trazê-lo de volta à lucidez. A revelação desmonta a narrativa inicial e mostra que Teddy criou sua versão da história para fugir do trauma de ter matado a própria esposa após ela afogar os filhos.

A fala que muda tudo: “O que é pior?”
Nos instantes finais, Teddy parece recair novamente no delírio. Ele chama o médico de “chefe”, como fazia antes do tratamento, dando a entender que voltou à fantasia do agente federal. É aí que surge a fala mais discutida do longa: “O que é pior? Viver como um monstro ou morrer como um homem bom?”.
A frase pode ser interpretada como um sinal de que Teddy recobrou a consciência, mas escolheu fingir a recaída para aceitar o destino de ser lobotomizado. A culpa pela tragédia familiar é tanta que viver com suas memórias seria insuportável. Essa escolha transforma o final em um dos mais trágicos e profundos de Scorsese.
Culpa, trauma e identidade fragmentada
A Ilha do Medo constrói seu final a partir dos símbolos que acompanham Teddy/Andrew. O mar aparece como memória traumática dos filhos afogados. O farol simboliza iluminação — o lugar onde a verdade finalmente se revela. Tudo converge para mostrar que o trauma foi tão devastador que o personagem preferiu criar uma identidade nova para sobreviver.

Essa fragmentação do eu é o eixo fundamental da história: uma mente que se protege criando outra narrativa, mais suportável que a realidade. É um mecanismo doloroso, mas profundamente humano.
A mensagem de Scorsese
Scorsese usa o filme para discutir até onde alguém pode ir para escapar da própria dor. O diretor conduz o espectador pelos mesmos enganos que cercam Teddy, fazendo com que a revelação final seja tão chocante para o público quanto para o personagem. O desfecho não é apenas sobre loucura, mas sobre a incapacidade de enfrentar traumas que ultrapassam qualquer estrutura emocional.
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