A importância da lã

Itaipu Beneficiados Ebanner 300x250px 1

Muito antes do surgimento das fibras sintéticas ou das roupas em larga escala, a humanidade já contava com a lã como aliada essencial na proteção contra o frio, na criação de vestimentas e até na construção de identidade cultural. Mais do que um simples tecido, a lã representa um elo entre o ser humano e os animais, entre o campo e a cidade, entre o passado artesanal e o presente tecnológico.

Durante séculos, povos ao redor do mundo desenvolveram técnicas específicas de tosquia, fiação e tecelagem — não apenas para suprir suas necessidades básicas, mas também para expressar arte, status e inovação. Neste artigo, vamos explorar o papel crucial que a lã desempenhou ao longo da história, sua importância econômica, cultural e ambiental, e como esse material nobre ressurge no século XXI como alternativa sustentável diante das crises ecológicas da indústria da moda. A lã aquece corpos, movimenta economias e preserva tradições — e sua relevância está longe de ser apenas histórica.

Uma matéria-prima com raízes profundas na história humana

A história da lã acompanha a própria história da domesticação animal. Estima-se que há mais de 10 mil anos ovelhas já eram criadas no Crescente Fértil, região que compreende partes do atual Oriente Médio. A seleção genética das raças ovinas focava não apenas na produção de carne e leite, mas sobretudo na obtenção de pelos macios, longos e resistentes — perfeitos para fiação. Povos da Mesopotâmia, Egito, Pérsia e, mais tarde, da Europa e da Ásia Central fizeram da lã um símbolo de riqueza e sofisticação.

No Império Romano, a lã era tão valorizada que existiam leis específicas sobre sua produção e comércio. Na Idade Média europeia, tornou-se pilar econômico de cidades inteiras — como Florença e Bruges — que prosperaram com o comércio têxtil. Já nas regiões andinas, povos como os incas utilizavam a lã de alpacas e lhamas para confeccionar mantos cerimoniais, com significado espiritual e social.

LER >>>  As edições mais memoráveis do Big Brother Brasil: Uma retrospectiva das temporadas de maior audiência

Mais do que proteger do frio, a lã era um marcador de identidade. Cada povo, cada tribo, cada cultura desenvolveu sua própria forma de trabalhar o fio — tingindo, trançando, bordando ou tecendo. Em regiões frias, tornou-se insubstituível. Em regiões montanhosas, vital. Em todos os casos, insuperável em sua combinação de leveza, isolamento térmico e durabilidade.

Características únicas que fazem da lã uma fibra nobre

A lã é, essencialmente, o pelo tosado de animais como ovelhas, cabras (no caso da lã de cashmere), lhamas, alpacas e até coelhos angorá. Sua composição natural, rica em queratina, confere propriedades que nenhuma fibra sintética conseguiu replicar totalmente.

Ela é termorreguladora: aquece no frio, mas permite a respiração da pele. É também higroscópica, ou seja, consegue absorver umidade do corpo sem deixar a sensação de molhado — o que a torna ideal para roupas de inverno, roupas de cama e até palmilhas de calçados. Além disso, é naturalmente antichamas e biodegradável, atributos raríssimos em materiais têxteis modernos.

Outro ponto de destaque é sua resiliência: a lã volta à forma original após amassada, sendo uma fibra naturalmente elástica e durável. Por isso, peças de lã bem cuidadas podem durar décadas — e muitas vezes são passadas de geração em geração como parte do acervo familiar.

Hoje, a lã também se adapta aos tempos modernos. Graças a avanços tecnológicos, surgiram lãs ultrafinas, laváveis em máquina, hipoalergênicas e adaptadas para esportes de alta performance. Grandes marcas de moda, como Patagonia, Icebreaker e até estilistas de alta-costura, voltaram a apostar na lã como símbolo de luxo sustentável.

lã

A lã na economia e na cultura do Brasil

O Brasil, embora não seja tradicionalmente conhecido por seu clima frio, possui uma longa tradição na produção de lã, especialmente nas regiões Sul, como o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. A introdução das ovelhas Merino e Corriedale no século XIX permitiu o crescimento de um setor lanífero sólido, especialmente voltado à produção de tecidos para malharias e artesanato.

LER >>>  Encontrado um túmulo de guerreiro de 7 mil anos com tesouros ocultos

Durante décadas, a lã brasileira enfrentou concorrência acirrada das fibras sintéticas, mais baratas e abundantes. Contudo, nos últimos anos, com o avanço do debate sobre sustentabilidade na moda, houve um ressurgimento do interesse por fibras naturais — e a lã voltou ao centro das atenções. Cooperativas de pequenos produtores, muitas vezes lideradas por mulheres, têm se destacado ao unir saberes tradicionais com inovação, desenvolvendo peças de alta qualidade e forte apelo artesanal.

Além disso, o tricô e o crochê ganharam status de arte. Artistas têxteis brasileiras usam lã como linguagem estética, participando de exposições e ações urbanas que ressignificam a lã como ferramenta política, sensível e identitária.

Lã e sustentabilidade: o desafio e a oportunidade

No mundo atual, a indústria da moda é uma das mais poluentes. Estima-se que mais de 60% das roupas sejam feitas de materiais sintéticos, como poliéster e nylon, derivados do petróleo e altamente prejudiciais ao meio ambiente. A lã surge, nesse cenário, como um contraponto sustentável.

Sendo uma fibra natural, renovável e biodegradável, a lã reduz a dependência de recursos não renováveis. Quando produzida de forma ética — com boas práticas de bem-estar animal e uso responsável de recursos — ela representa uma alternativa de menor impacto ambiental e maior durabilidade. Além disso, peças de lã demandam menos lavagens, resistem melhor ao odor e não liberam microplásticos nos sistemas de água.

A crescente valorização do slow fashion, movimento que preza por consumo consciente e valorização do trabalho artesanal, encontrou na lã uma de suas protagonistas. Consumidores estão mais atentos à origem das peças, ao processo de fabricação e ao destino das roupas após o uso. A lã responde a todos esses quesitos com excelência — desde que o sistema produtivo respeite os critérios de sustentabilidade.

LER >>>  Os 9 livros mais premiados de todos os tempos

Hoje, certificações como Responsible Wool Standard (RWS) e ZQ Merino garantem que a lã provém de fazendas que respeitam o meio ambiente, o bem-estar animal e os direitos dos trabalhadores. Esses selos tornaram-se referência no mercado têxtil global.

Mais que um tecido: a lã como símbolo de cuidado e permanência

Em tempos de descartabilidade e pressa, a lã nos convida à pausa. Ao contrário das roupas que duram uma estação e depois somem, ela exige cuidado — e retribui com durabilidade. Aquecer-se com uma peça de lã é como envolver-se em história, memória e permanência. É sentir o calor de algo que foi produzido com tempo, com técnica e com propósito.

A lã une o passado ao futuro. Representa tanto as técnicas ancestrais de tecelãs do interior quanto as pesquisas de laboratórios de fibras avançadas. Serve tanto ao design de vanguarda quanto ao cobertor da casa da avó. E isso a torna única.

Ao entendermos a importância da lã, não estamos apenas aprendendo sobre um material. Estamos redescobrindo valores esquecidos: o respeito à natureza, o tempo das coisas bem feitas e o afeto que se entrelaça entre os fios. A lã nos lembra que vestir-se também pode ser um ato de consciência — e de beleza.

Leia também:

lã